São Paulo, quarta-feira, 29 de novembro de 1995
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Pinturas do quinto Beatle são expostas nos EUA

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

Na onda do revival dos Beatles, uma galeria de arte em Washington promove a primeira retrospectiva nos EUA do trabalho de Stuart Sutcliffe, um dos integrantes originais da banda, morto em 1962, aos 21 anos.
A irmã de Sutcliffe, Pauline, diz que durante anos ela e a família tentaram afastar sua arte da ligação dele com os Beatles. Mas agora ela diz que "este é um fato da vida" e não vale a pena combatê-lo.
Segundo Pauline, que é a principal promotora do espólio artístico de Sutcliffe, a conexão Beatles abriu e fechou portas para o trabalho do irmão mas "acrescenta mais uma ponta de fascinação" por ele em muitas pessoas.
Fora os beatlefanáticos, a maioria do público só tomou conhecimento da existência de Sutcliffe por meio do filme "Backbeat", que no ano passado fez algum sucesso de crítica e bilheteria nos Estados Unidos.
Dirigido pelo estreante Ian Softley, "Backbeat" é um excelente recorte do período inicial dos Fab Four, centrado na amizade -para muitos pelo menos platonicamente homossexual- de John Lennon com Sutcliffe.
Os dois se conheceram em 1957 na Escola de Arte de Liverpool, Inglaterra, e dividiram inúmeras afinidades, em especial no que se refere à música, arte, poesia beat, moda e atitude de vida.
O documentário oficial da história do conjunto, "Antologia", dedica apenas alguns minutos em referências rápidas a Sutcliffe e sugere que ele integrou a banda apenas porque o empresário que a levou para Hamburgo, Alemanha, exigia um quinteto em vez de um quarteto.
"Antologia" também dá a entender que Sutcliffe, que tocava baixo, enquanto Lennon, McCartney e Harrison ficavam com guitarras e Pete Best com a bateria, era inexpressivo do ponto de vista musical.
Tanto "Backbeat" quanto Pauline têm outra versão: Sutcliffe, muito mais talentoso do ponto de vista artístico e humano do que os outros quatro Beatles, se dividia entre a pintura e a música.
A qualidade do seu trabalho, nos dois casos, era típica de um iniciante nas duas áreas. Mas, argumenta Pauline, também esse era o caso de Lennon, McCartney e Harrison com a música.
Muito bonito, Sutcliffe atraía a atenção de homens e mulheres na moralmente liberada Hamburgo do início da década de 60 e cultivou intensa relação amorosa com o casal Eduardo Paolozzi e Astrid Kirchherr, ele marchand e ela fotógrafa, que teve forte influência sobre os Beatles.
Os quadros em exibição na Govinda Gallery, em Georgetown, o bairro boêmio de Washington, mostram um artista em formação, com indiscutível potencial, mas com muito a realizar.
As dúvidas existenciais de Sutcliffe se revelam até na variedade de estilos que adotou, do impressionismo ao expressionismo abstrato, em sua curtíssima carreira como pintor (de 1957 a 1958, quando se juntou aos Quarry Men -primeiro nome dos Beatles-; e de 1961, quando se desligou, a 1962).
A maioria dos trabalhos expostos na Govinda são em papel e da sua fase final, quando estava sob evidente influência dos expressionistas abstratos como de Kooning e Rothko.
Possivelmente, se não fosse a combinação de sua ligação com os Beatles e a idade com que morreu (de hemorragia cerebral massiva), o trabalho de Sutcliffe jamais teria despertado o interesse do público.
Mas, como argumenta sua irmã, uma psicoterapeuta que continua a cruzada da mãe, morta em 1983, de despertar o mundo para a arte de Sutcliffe, estes são "fatos da vida" e seria idiota desprezá-los.
A exposição em Washington, inaugurada este mês, permanece em cartaz até 20 de janeiro. A galeria fica na rua 34, número 1227.
Em dezembro, Pauline Sutcliffe lança um livro de sua autoria com Kay Williams, "A Vida e a Arte de Stuart Sutcliffe", com reproduções de quase todos os seus quadros, em tiragem limitada de 2.000 cópias. A editora é a prestigiosa Genesis, de Londres.

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