São Paulo, domingo, 3 de dezembro de 1995
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Exército envia tropas para Angola e deve R$ 52 milhões

RUI NOGUEIRA
COORDENADOR DE PRODUÇÃO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Missão de Paz do Brasil enviada a Angola a pedido da ONU (Organização das Nações Unidas) deixou um rastro de dívidas no país. O Exército deve a seus fornecedores (R$ 52 milhões) e a ONU ao Exército, por não ter ressarcido o Brasil até agora em um centavo.
O Tesouro Nacional autorizou os militares a gastar R$ 121 milhões com equipamento, transporte e aquisição de material de infra-estrutura para os 1.100 soldados que estão em Angola. O Exército comprou o que achou necessário, mas o Tesouro não liberou toda a verba.
A maioria das empresas credoras é formada por indústrias têxteis de São Paulo e do Rio. Só os lanifícios Capricórnio e Santo Amaro e a São Paulo Alpargatas forneceram em roupas e jogos de cama e banho mais de R$ 20 milhões. O Exército também deve para a Hering e a Diana Paolucci cerca de R$ 6,5 milhões.
Em dificuldade para pagar o 13º dos seus funcionários e o pagamento do Exército atrasado em 65 dias, algumas empresas colocaram seus representantes à porta do QG (Quartel-General), em Brasília, para pressionar o Ministério do Exército a cobrar o Tesouro.
Lideradas pelo Lanifício Capricórnio, algumas empresas chegaram a pensar na possibilidade de entrar com uma ação coletiva na Justiça por meio da Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil).
Desistiram da idéia ao saber que, com a disputa jurídica, poderiam ser afastadas da concorrência aberta na semana passada para fornecer mais material à tropa que no ano que vem vai substituir os soldados enviados. O Orçamento de 96 já prevê gastos de R$ 55 milhões com essas missões.
A assessoria do Ccomsex (Centro de Comunicação Social do Exército) confirmou à Folha a dívida de R$ 52 milhões e disse que espera "para os próximos dias" a liberação pelo Tesouro de R$ 62 milhões. "Como a mercadoria já foi entregue e as notas fiscais já foram recebidas, não há como os fornecedores não serem pagos. É só uma questão de tempo", informou o Ccomsex.
Enquanto o Tesouro não resolve o problema do caixa, o QG, que fica no extremo oeste do Eixo Monumental de Brasília, recebe a visita diária e constrangedora dos representantes da indústria têxtil que cobram urgência no pagamento.
Na ponta leste do Eixo Monumental, na Esplanada dos Ministérios, o Emfa (Estado-Maior das Forças Armadas), coordenador das missões de paz envolvendo tropas brasileiras, e o Itamaraty esperam que a ONU comece a ressarcir o governo brasileiro das despesas com o trabalho em Angola.
Os brasileiros e mais tropas e observadores de 33 países foram convocados para Angola, ex-colônia portuguesa em guerra civil há 20 anos, para assegurar o cumprimento do Acordo de Lusaka.
O acordo impôs a trégua entre o MPLA (Movimento Popular para a Libertação de Angola), no poder desde a independência em 75, e a Unita (União Nacional para a Independência Total de Angola), guerrilha de oposição. Prevê a formação de um governo de coalizão.
Em dificuldades financeiras e com dívidas de cerca de US$ 3,5 bilhões, a ONU nem sequer está ressarcindo o Brasil dos gastos com salários pagos à tropa. Pelo acordo internacional, cada soldado recebe por mês US$ 980 depositados no Brasil e mais US$ 1/dia pago em dinheiro em Angola. Por enquanto, a tropa também está comendo as rações levadas do Brasil.
A ONU também não definiu como serão os contratos de indenização pela deterioração dos equipamentos de propriedade das Forças Armadas usados nas operações. Os contratos antigos, de cinco anos, que previam a indenização de 20% do valor do equipamento a cada ano, foram suspensos até que seja definida uma nova fórmula.

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