São Paulo, domingo, 10 de dezembro de 1995
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A economia manda

DEMIAN FIOCCA

Theodore Lowe, ex-presidente da Associação Americana de Ciência Política, observa em artigo publicado no Brasil em 94 que a economia substituiu o direito como linguagem do Estado. No Brasil, a manutenção da enorme desigualdade resulta de decisões quotidianas de política econômica.
A eliminação da alíquota de 35% de IR para os que ganham mais de R$ 14,3 mil ao mês é um meio evidente de concentrar renda.
O governo empenhou no salvamento do Nacional recursos estimados entre R$ 2 bilhões e R$ 4 bilhões. E o fez sem dar maiores satisfações, com o argumento válido, porém não definitivo, de zelar pela solidez do sistema bancário. Pretende agora arcar com o prejuízo do Econômico, cuja quebra já ocorreu sem ameaçar o sistema.
Em vez de pagar esses prejuízos com dinheiro público, pode-se impor ao próprio sistema financeiro o ônus. Os recursos que fugiram do Econômico e do Nacional não saíram do país. Foram para outros bancos, alguns dos quais patrocinaram a boataria e fazem excelentes negócios com a chamada crise.
Na Argentina, por exemplo, o governo proibiu a abertura de novas agências, de modo a forçar a incorporação de bancos em má situação. Programas de fusões em outros países exigiram em troca de dinheiro público ao menos algumas garantias para os funcionários.
A nota para a imprensa do BC mostra que o Estado gastou com juros R$ 34,5 bilhões entre janeiro e agosto. E nunca chegaram a ser esgotados instrumentos como os compulsórios, que nada custam. A desregulamentação de fluxos financeiros, ademais, multiplica os ganhos contra o Tesouro. O Chile, por exemplo, controla-os.
A manutenção do desaparelhamento da Receita Federal é também uma opção política de razoável envergadura.
Em paralelo a essa postura compreensiva para com certos interesses, o governo mostra-se transtornado com alguns gastos sociais. O total dos pagamentos de aposentadorias no ano, porém, está na casa dos R$ 32,7 bilhões, segundo previsão do ministério. É menos do os sete meses de juros. E, se houver prejuízo, será menor do que o gasto com salvamento a bancos.
Os fatos recentes mostram uma ação consistente de preservação da desigualdade, se não mesmo de concentração de renda. Quando a política econômica é conservadora, pouco importa a presença no governo de sociólogos, humanistas ou algumas pessoas preocupadas com o interesse público.

Hoje, excepcionalmente, MARCOS CINTRA não escreve esta coluna.

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