São Paulo, domingo, 10 de dezembro de 1995
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FHC deve apoiar CPI

ALOYSIO BIONDI

Com a palavra, o procurador da República Odim Ferreira: "O Banco Central não colabora com a Polícia Federal e Receita Federal na apuração de fraudes e remessas de dinheiro para o exterior, que roubam dólares do país e representam sonegação de impostos. Pior ainda: O BC chega a dificultar as investigações" ("Gazeta Mercantil", 18 de outubro último).
A mesma conclusão foi divulgada pela Comissão Especial de Investigação, formada no governo Itamar Franco. Para ela, determinadas publicações do Banco Central são um verdadeiro "guia" para ensinar as empresas e empresários a aproveitar brechas da lei (deixadas pelo próprio BC...) para sonegar e remeter dinheiro para fora -conforme reportagem publicada por esta Folha, em 8 de janeiro deste ano.
Exemplos como esses encheriam uma página de jornal. Mas esses dois são suficientemente insuspeitos para permitir que se levante uma questão: até quando o país continuará dando poderes ilimitados ao Banco Central e ao Ministério da Fazenda, quando sua omissão e conivência com ações contrárias aos interesses do país estão comprovadas?
O próprio programa de "socorro" aos bancos, recém-lançado, reforça a necessidade de mudanças, pois sobram indícios de que o tal Proer tem como principal objetivo impedir a apuração de fraudes e crimes contra o país.
Eis as pistas que levam a essa hipótese:
Eficiência - a equipe FHC afirma que alguns bancos não teriam evoluído "administrativamente". Ora, o Econômico tinha um ex-presidente do Banco Central em sua diretoria; outro ex-presidente do BC era acionista de um banco recém-quebrado; e uma instituição fechada na crise de outubro de 1994 era de propriedade do próprio presidente de uma das principais entidades de exportadores do país...
Modernização - a própria exposição de motivos do Proer diz que o setor bancário investiu nada menos de US$ 4 bilhões, em dois anos, em automação e computação.
Escala - irresponsavelmente, a equipe FHC usou como argumento a necessidade de apoiar a fusão de pequenos bancos, que "inevitavelmente vão desaparecer". Ora, os pequenos bancos tiveram lucros fantásticos em 1994. Dez deles lucraram nada menos de 40% a 70% sobre o patrimônio, ou até cinco vezes mais do que os 13% dos grandes bancos...
Queda da inflação - o mito de que os bancos "quebrariam" com a queda da inflação foi desmentido pelo seu lucro recorde de US$ 4 bilhões em 1994.
Esse o retrato do setor, que desmente totalmente a equipe FHC. Resta ver agora como é que o Nacional, recém-socorrido, se encaixava nesse quadro.
Os dados mostram que sua situação era brilhante: desde 1993, o Nacional havia ficado livre da dependência do chamado "lucro da inflação", pois a receita dos empréstimos já chegava a 44% do "faturamento total" -ou, atenção, o dobro dos 23% do Unibanco... Em 1994, novo salto de 78% nessas receitas, contra 51% do Itaú e do Bradesco.
Estamos chegando ao fim do mistério. Como é que um banco "modernizado" como o Nacional quebra? E como pequenos bancos lucram até 70% ao ano?
A resposta é simples: o sistema financeiro brasileiro é marcado por operações gigantescas, parte delas ilegais ou aparentemente legalizadas pelas "brechas" deixadas pelo BC. Como são negócios de bilhões de reais, basta que alguns deles sejam "malsucedidos" para que a instituição sofra prejuízos gigantescos.
A chance dessas fraudes e/ou crimes chegarem ao conhecimento da opinião pública só ocorre quando sobrevém a "quebra" -e ela é investigada e chega à Justiça. É aqui que entra em cena o novo programa do BC: se o governo "ajudar" um banco a comprar outro, o "quebrado", tudo pode ser acertado entre quatro paredes e alegar-se sigilo para não divulgar informações. Pode-se acobertar crimes e fraudes, bem como a omissão e conivência do BC e Ministério da Fazenda.
Quando o Econômico estourou, o presidente FHC vetou a formação de uma CPI para investigar o sistema financeiro. Por quê? Se deseja "mudanças" no país, deve ser o maior interessado em apoiar a iniciativa.

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