São Paulo, domingo, 10 de dezembro de 1995
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Tecnologia bloqueia ação de genes

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Nos últimos anos começaram a aparecer os primeiros resultados comerciais da aplicação de uma biotecnologia idealizada nos fins da década de 70, que usa o ácido ribonucléico (RNA) chamado de anti-senso para bloquear a ação de genes específicos.
A tecnologia foi primeiro desenvolvida para fornecer aos biólogos moleculares um meio para obter mutação de genes nas células dos organismos superiores.
O exemplo mais significativo dessas realizações são tomates que se mantêm túrgidos, sem murchar ou amassar, por prazo mais longo que o normal, permitindo sua mais segura e demorada conservação no transporte e nas prateleiras. Conseguiu-se esse feito pela inserção de RNA anti-senso correspondente a uma enzima que quebra as paredes das células da planta e é inibida pelo processo.
Para melhor compreensão dessa tecnologia, convém recordar por alto fenômenos que asseguram a transmissão genética contida no DNA (ácido desoxirribonucléico) do gene. Nessa transmissão, a mensagem genética guardada no código de DNA é copiada ou transcrita em RNA chamado mensageiro, que se encarrega de levá-la para fora do núcleo sintetizar a proteína codificada no DNA.
Os genes, como se sabe, são constituídos de duas hélices complementares de DNA, cada uma das quais é fieira de nucleotídeos, as unidades químicas do DNA.
Mas em geral só uma das hélices é transcrita em RNA mensageiro. Jonathan Izand e Harold Weintraub raciocinaram que, se a porção do gene que codifica a proteína fosse suprimida, os mecanismos reguladores do gene providenciariam transcrição da outra hélice, o que equivaleria à produção, pela célula, de seu próprio RNA anti-senso.
Esse RNA anti-senso se adaptaria à sequência do RNA mensageiro original e, assim, impediria que ele dirigisse a formação das proteína. Os pesquisadores passaram da especulação à experiência e demonstraram que a síntese da enzima timidina cinase é bloqueada em células de camundongo quando nelas se introduz, juntamente com o gene normal, o da timidina cinase previamente alterado.
Tudo indica que o RNA produzido pelo gene alterado se une ao RNA mensageiro oriundo do gene normal e o inativa, confirmando, pois, a suposição dos cientistas.
Outro pesquisador, Douglas Melton, desenvolveu tecnologia diferente para o mesmo fim. Por meio de simples injeção de RNA anti-senso sintético, conseguiu prevenir a síntese de proteínas específicas em ovos de rã.
Essa tecnologia e a de Izant e Weintraub passaram a ser usadas em várias situações como resultados igualmente satisfatórios. Obtiveram-se, assim, plantas transgênicas resistentes ao vírus do mosaico e camundongos resistentes a um vírus de leucemia.
Produtos sintéticos do tipo usado na tecnologia de Melton têm sido preparados e utilizados com êxito para deter a replicação de células cancerosas em cultura. Aplicada ao reino vegetal, a tecnologia do anti-senso tem dado resultados positivos, como no caso do tomate que demora a se deteriorar, e na obtenção de flores de surpreendentes cores. Mas também a aplicação vegetal tem apresentado dificuldades que, na opinião de alguns pesquisadores, justificam o reexame da questão do RNA anti-senso como um todo.

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