São Paulo, quarta-feira, 13 de dezembro de 1995
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Santos e Botafogo são os reis da bossa-nova

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Os anos 60 estão de volta, dizem, com o retorno ao pódio de Botafogo e Santos, os reis da bossa-nova e do iê-iê-iê. Não só pelo futebol ofensivo, veloz, técnico, leve e emocionante que ambos têm praticado, o que explica, por exemplo, pelo menos aqui na velha província, o encanto de palestrinos, corintianos, tricolores e lusos pelo Santos.
Realmente, desde aqueles tempos nem tão risonhos, não se sentia tal solidariedade em torno do time santista. Não pelo Santos em si, mas muito mais pelo futebol aprazível que oferece. Essa, sim, é a ponte que nos leva de volta aos anos 60, talvez a época mais efervescente e contraditória do século. Sim, porque há vários anos 60. Na sua primeira metade, sob a atmosfera da utopia socialista que pairava no ar, entendida como tempos futuros de solidariedade e fraternidade, foi uma década de muita criatividade. Depois, a ruptura gerou conturbação, cisão, e, já nas vésperas dos 70, trevas e abulia.
Não é a toa que, no futebol, a retranca tomou jeito de ciência aplicada em 1964, com o advento do chamado cabeça-de-área. Aqui, Denílson, do Flu, esse mesmo Fluminense que chegou às portas das finais neste ano, exatamente pela força sua força defensiva. E, na Europa, com Trappatoni, chegamos ao extremo de um beque à frente da linha de quatro zagueiros e de um líbero atrás. Todos preocupados em evitar que Pelé pudesse jogar.
Hoje, às vésperas da primeira decisão entre Santos e Botafogo, ouço no rádio que os jogadores do Botafogo, principalmente o quarto-zagueiro Gonçalves, defende uma marcação individual, feroz, ferrenha a Giovanni, o Pelé dos nossos dias, guardadas as imensas proporções.
Na proposta, vem subjacente, um toque de malícia: como Giovanni está pendurado com dois cartões amarelos, sob severa marcação, quem sabe não reagirá de maneira desairosa, obrigando o juiz a lhe dar o terceiro cartão amarelo, afastando o craque da final no Pacaembu?
E é aqui que entram as profundas diferenças entre os anos 60 e 90. Naqueles tempos, ainda não havia o cartão amarelo, criado para a Copa de 70 apenas como uma expressão universal, pela dificuldade de entendimento entre o árbitro e os jogadores de idiomas diferentes.
O cartão amarelo, pois, decididamente, não foi criado para punir o craque. Foi para facilitar o entendimento. Mas que entendimento pode ter o craque com os juízes complacentes, que, juntamente com a opinião pública, acostumaram-se às irritantes e sucessivas faltinhas que se acumulam no meio-campo, matando o ato de criar e a própria essência do futebol -o gol- no seu nascedouro?
Como Giovanni chegou a dois cartões amarelos? Certamente não foi por praticar o antijogo ou faltas violentas, pois se há alguém que sabe jogar e gosta disso no futebol brasileiro de hoje é exatamente esse craque excepcional. Ganhou-os por reclamações. E reclamou do quê? Justamente da violência e da malícia dos adversários que não o querem deixar jogar.
Eis por que urge adotar aquela regrinha que só os desatentos ou maldosos contrariam: a das faltas coletivas transformadas em cobrança de tiro livre direto.

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