São Paulo, sexta-feira, 15 de dezembro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CPI termina com acusações sem provas

ELVIS CESAR BONASSA
DA REPORTAGEM LOCAL

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou a arrecadação de direitos autorais no país terminou na semana passada com um relatório confuso, cheio de acusações infundadas.
As investigações não conseguiram atravessar a fronteira da mera suspeição, na maior parte das vezes sem provas consistentes.
Ao lado de algumas constatações documentais, como problemas na contabilidade do Ecad (Escritório Central de Arrecadação de Direitos Autorais), a CPI sugere ao Ministério Público (MP) nada menos do que 97 indiciamentos, por supostos crimes de abuso do poder econômico, sonegação fiscal, falsidade ideológica e formação de quadrilha.
O próprio relator da CPI, deputado Eraldo Trindade (PPB-AP), afirma que muitos nomes foram incluídos no rol dos suspeitos sem motivo muito claro, compartilhando a responsabilidade pelos pedidos de indiciamento com os outros membros da CPI.
"Como relator, tenho que me curvar à maioria da comissão, que foi favorável à inclusão desses nomes, embora alguns não tenham coisas tão graves para atribuir uma responsabilização convicta", disse Trindade, em entrevista por telefone à Folha.
Nos pedidos de indiciamento por formação de quadrilha, a CPI chegou a incluir a advogada Vera Lúcia Teixeira. Seu suposto envolvimento: "defende o monopólio do Ecad em diversas ações impetradas na Justiça". Atribuem culpa a uma advogada por defender um cliente nos tribunais, o que é um evidente absurdo.
Outro exemplo de pedido de indiciamento com bases duvidosas é o do vice-presidente da Sicam (Sociedade Independente dos Compositores e Autores de Música), Antonio Lazarrotti Filho: "segundo denúncias, ficou rico em pouco tempo, pois morava em uma kitchenette e hoje, não se sabe como, é possuidor de uma mansão". Essas "denúncias" não foram investigadas nem confirmadas pela própria CPI.
A fórmula "segundo denúncias" foi usada em vários casos apresentados no relatório para justificar pedidos de indiciamento. Os membros da CPI não conseguiram apurar fato nenhum e resolveram, baseados em denúncias sem provas, incluir nomes.
Mesmo admitindo a falta de base de muitos pedidos de indiciamento, o relator Eraldo Trindade afirma que não houve irresponsabilidade.
"Há indícios, o relatório não foi irresponsável. Mas nesses fatos técnicos, a decisão da comissão foi mais política", afirma.
A leviandade das conclusões da investigação sobre as pessoas não retira, no entanto, a força de algumas conclusões melhor fundamentadas da CPI.
É o caso da manipulação da contabilidade do Ecad. Conforme apontado em auditorias contábeis em anos sucessivos, o Ecad não aplicava correção monetária nenhuma sobre os dados contábeis, gerando resultados falsos.
Além disso, a CPI verificou que a maior fatia dos direitos autorais (55,59%) fica nas mãos de editoras musicais, subeditoras e associações estrangeiras. Menos de um terço dos direitos arrecadados chegam efetivamente às mãos dos autores no Brasil.
Junto com o relatório, a CPI apresentou um projeto de lei que reformula a arrecadação dos direitos autorais. "Esse projeto foi o resultado mais importante da CPI", diz Trindade.
São dois os pontos centrais: fim do monopólio do Ecad na arrecadação e exigência de apresentação prévia de planilha de programação por parte de emissoras de rádio e TV e locais públicos de execução de música.
Atualmente, o Ecad é o único órgão com atribuição legal de arrecadar direitos autorais. Pelo projeto, serão criados pelo menos dois órgãos, separados e independentes, para exercer essa função.
Com a exigência de apresentação de planilhas, a fiscalização fica facilitada. Hoje, a cobrança é feita com base em escuta de rádio e TV. Postos do Ecad fazem essa escuta por amostragem e tiram a média de execução de cada música, para calcular o quanto de direito autoral cabe a cada artista.

Texto Anterior: MAM exibe fragmentos do corpo em exposições
Próximo Texto: Bomba! Bomba! Deu pintado na brasa!
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.