São Paulo, sábado, 16 de dezembro de 1995
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A vida será uma bola que virá do mar

MATINAS SUZUKI JR.
EDITOR-EXECUTIVO

Meus amigos, meus inimigos, a novidade, como diriam o santista Gilberto Gil e o flamenguista Herbert Vianna, veio lá da praia. Da beira do mar, dos sete mares, dos mares de loucura.
Um marinheiro me contou que a boa brisa lhe soprou que vem aí bom tempo, como cantava o nense Chico Buarque.
E a vida vem ondas como o mar, como diria o botafoguense de muitas "moraes", que virou zen-surfismo na versão do Lulu e do Nelsinho, e rola agora em italiano na voz do Renato Russo.
Então tá combinado: a bola é uma sereia, uma morena do mar. Para nós, brasileiros (quer dizer, meio europeus, meio africanos), o rito de passagem de um ano para o outro, que vem aí, se dá no mar.
Botafogo e Santos são duas canções praieiras, dois times à beira mar, do porto, do cais, do movimento, do partir e do chegar, do começo do caminhar para quem quer se soltar. (Os lenços brancos da torcida santista, desfraldados no Pacaembu, são, ao mesmo tempo, uma saudação e um adeus, uma despedida).
Amanhã será um lindo dia. Amanhã será o dia da alegria. Da parábola da renovação. Dia de encher a bola do fut futuro. Novos campeões. O campeão é alguém que campeia. Alguém que procura. Procurar é curar com o novo.
O amanhã de Sampa começa hoje. Com o funk e a levada do charme do muso da bola Jorge Ben Jor (já vejo a festa das magnéticas no Palace).
E não se esqueça que é melhor a parábola do que parar a bola. Porque nós queremos bola pra frente. Jogo rápido.
E amanhã será o dia da abertura dos portos às nações amigas do novo. A modernidade chegou ao Brasil pelos portos. São Paulo não pode parar. São Paulo não pára a bola. São Paulo é parabólica.
Essepê, no seu mais lindo estádio, o Pacaembu, vai recolher a novidade que veio dar na praia em forma de bola. E vai navegá-la, de volta, nas torres das internets, das infovias, para o mundo.
Santos e Botafogo são os últimos românticos do litoral do oceano Atlântico. Futebol romântico: acreditam na ousadia, na vida, paixão e morte pelo gol. O melhor de ambos é a ofensiva. Contra o classicismo dos esquemas defensivos, a libertação através do êxtase do gol.
Rola a bola. Rola a vida. O mundo é uma bola. E a bola, como o mundo, gira. Na era da globalização do fut, a novidade é o velho. Ou seja, o ataque.
O pós-Copa de 94 mostrou que todas as idéias do futebol defensivo são jurássicas, natimortas. O poeta é o artilheiro.
Na Inglaterra, na Espanha, na Itália, na Holanda, principalmente na Holanda, vemos felizes o triunfo do gol sobre o não-gol. Do espetáculo sobre o não-espetáculo. Da vida sobre a não-vida.
Gol é penetração. E penetração é fecundação. É a criação de uma nova vida. É nascimento. Salve don Giovanni, Criador. Salve Servius Tulius, Criador.
Meus amigos, meus inimigos, eu quero a estrela (solitária) da manhã.
E eu, meus inimigos, que amo os meus amigos, em verdade, vos digo: eu tenho esse peixe e dou de coração.
PS: Responda depressa, qual é a menor distância entre uma estrela e um peixe? A bola. A vitória é a libertação. Nada do que foi será, a partir de amanhã.

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