São Paulo, sábado, 16 de dezembro de 1995
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A única opção é avançar

PAULO RABELLO DE CASTRO

Os protestos contra as reformas ditas neoliberais na França não têm a mínima chance de atrasar ainda mais as reformas no Brasil. Por mais que, na aparência, as reformas lá e aqui se assemelhem, as propostas são diferentes e mais distintas ainda as circunstâncias políticas que as envolvem.
O governo Chirac/Juppé, de tendência dita conservadora, não quer conservar; afirma que a França precisa mudar, e logo, antes que afunde na decadência econômica e perca o bonde da União Européia, que exige um equilíbrio fiscal impossível de ser atingido caso persistam os déficits da previdência, das empresas estatais francesas e os crescentes custos do sistema de saúde pública.
A reação dos sindicatos de funcionários públicos e de empresas estatais é mais do que compreensível: direitos esperados ou em fase de aquisição estão sendo postergados ou eliminados em nome do futuro equilíbrio financeiro do Estado francês. Afinal, que seria da França sem o protesto dos sindicalistas e estudantes?
Mas, apesar da simpatia e paciência do povo francês com o desconforto das greves, o governo deles sabe -e o povo compreende- que tais reformas são inevitáveis para adequar a França, como unidade produtiva, à desafiadora competição global da qual ninguém se livra.
Tenho certeza de que a opinião pública brasileira entende a situação na França exatamente assim. É preciso mudar logo e muito, na direção correta. O cidadão pensa: "Se na França, que é a França, a previdência está em dificuldades, a saúde não se financia e as estatais estão na berlinda, o que dizer do nosso desorganizado Brasil?". Aqui o desafio das reformas é ainda maior do que lá.
Então, pelo contrário, a crítica silenciosa do cidadão brasileiro ao processo de reformas no Brasil não é que essas reformas "ameacem seus direitos", mas sim que sejam reformas tão tímidas que não promovam avanço algum nem efetiva conquista de algum direito.
Que reformas estamos fazendo no Brasil? A da Previdência, tal como foi apresentada, erra o alvo por não dar ao cidadão o incentivo de, ao lado da previdência estatal, que deve ser saneada e preservada até um limite de salário, também ter uma previdência individual de capitalização, esta sim a única garantia de que no futuro haverá patrimônio palpável acumulado em nome de cada segurado (os funcionários franceses tampouco têm essa garantia).
Por isso temos insistido na idéia simples de dar a cada segurado da previdência brasileira o direito de opção por uma modalidade de plano básico que lhe garanta, por meio de um "certificado de poupança", a possibilidade de participar da privatização do patrimônio estatal brasileiro -num processo de pulverização sadia do capital do Estado que transformaria nossa democracia apenas política numa sociedade de oportunidades para todos: o "sociocapitalismo" (por que o governo francês não faz o mesmo com suas estatais?).
Ideologias à parte, as reformas na França avançarão porque não há melhor alternativa; no Brasil é que há melhores alternativas, só que nossas "reformas" hoje pecam por excesso de prudência e escassez de ousadia e criatividade. O brasileiro está cansado de fórmulas velhas: quer Reformas (com R maiúsculo) que gerem poupanças, investimentos, mais empregos, mais oportunidades.

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