São Paulo, quinta-feira, 21 de dezembro de 1995
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Baile funk é mergulho na cultura do morro

AZIZ FILHO
DA SUCURSAL DO RIO

Os constantes lançamentos musicais e a lotação dos bailes indicam que o funk vai repetir neste verão o sucesso do ano passado no Rio, quando desceu dos morros para virar coqueluche entre adolescentes do asfalto.
Quem chega ao Rio em um verão enlouquecido pelas obras da prefeitura, tem um motivo a mais para relaxar embalando-se nas eletrizantes coreografias dos bailes funks, ao som de raps que enlouquecem a garotada da zona sul.
Os templos mais sagrados da nova cultura continuam nos locais por onde ela começou a conquistar o Rio: os morros.
Passar a noite na favela pode parecer assustador nos dias de hoje, mas o medo não resiste ao ambiente descontraído e à vibração dos DJ's.
Segundo o DJ Marlboro, um dos mais concorridos, há cerca de 700 bailes funks na cidade e os enfrentamentos entre galeras ocorrem em menos de dez, a maioria em lugares afastados da zona sul, como Jacarepaguá (zona oeste) e a Baixada Fluminense.
É claro que não é aconselhável entrar em um baile com câmeras ou jóias valiosas, mas os cuidados não vão muito além disso.
É sempre melhor ir em grupo. Além da sensação de segurança, a garantia de diversão aumenta e as eventuais dificuldades para conseguir um táxi ou um ônibus na saída tendem a ser encaradas com mais humor.
Chapéu Mangueira
No morro Chapéu Mangueira (Leme), o baile mais concorrido da zona sul, o máximo que pode acontecer é você ser abordado por um nativo interessado em ensinar os passos de danças coreografadas para que você pare de "pagar mico". Não recuse a assessoria.
Promovido pela associação de moradores, o baile do Chapéu Mangueira ocorre às sextas-feiras, a partir das 22h, na quadra que fica em frente à casa da senadora Benedita da Silva e sua enteada, a modelo e atriz Camila Pitanga, frequentadora.
Irritados com o barulho, os moradores do Leme não se cansam de tentar liminares judiciais contra o baile. É melhor se informar antes de sair de casa.
A entrada é grátis e a frequência, variada. Os favelados já são minoria, diante da invasão cada vez maior de adolescentes oriundos do asfalto.
Você pode ir de táxi ou ônibus até as imediações da avenida Princesa Isabel, que divide Copacabana do Leme, e subir a pé cerca de 400 metros da ladeira Ary Barroso. Ao chegar à quadra, os músculos já estão aquecidos.
Coreografias
Cerca de cem coreografias integram a inesgotável criatividade dos funkeiros. As mais novas são as danças da bundinha (batendo umas nas outras), da cabeça (movendo o pescoço sem sair do lugar), do saci (com uma perna só) e do gorila (imitando o animal).
Para não se sentir deslocado, é bom que você tome alguns cuidados básicos ao se vestir para "zoar" no baile.
Nada de meias até o joelho ou de camisas floridas como alemão no Havaí. O ideal é usar tênis sem meia, camiseta e boné de times de basquete, beisebol ou futebol americano.
Camisetas de times paulistas de futebol não despertam hostilidade. A do Flamengo tem sucesso garantido.
Vestindo-se bem ao gosto dos funkeiros, você aumenta suas chances de levar alguém para o "paredão", como são conhecidos os locais nos arredores do baile onde rapazes e "minas" se "amassam".
Se você receber um "não" de uma garota, não insista na "cantada". Você pode virar "alemão", ou inimigo, para alguém influente na favela e que chegou antes na "parada". O baile, que poderia ser uma "uva", pode "lombrar", ou seja, fracassar por completo.
Rocinha
As observações valem para outro baile concorrido da zona sul: o da Rocinha, em São Conrado (zona sul). Você pode ir de táxi ou, nos principais corredores da zona sul em direção à Barra, pegar o ônibus 546 e saltar no número 250 da estrada da Gávea, já dentro da maior favela do Brasil.
O baile da Rocinha acontece nas noites de domingo e também é gratuito.
Há opções para quem prefere ambientes fechados. Os mais indicados na zona sul são os da discoteca Circus, em São Conrado (sábados, de 17h às 22h, ingresso a R$ 8), e o clube Emoções, no pé da Rocinha (domingo, de 19h à meia-noite, a R$ 4 e R$ 2).

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