São Paulo, domingo, 24 de dezembro de 1995
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Governo aperta o cerco sobre crimes financeiros

MILTON GAMEZ
DA REPORTAGEM LOCAL

O governo resolveu apertar o cerco contra os crimes cometidos contra o Sistema Financeiro Nacional. Não pelos prosaicos assaltantes de bancos, mas pelos próprios funcionários, executivos e donos de instituições financeiras.
O caso mais recente, e mais barulhento, é o da chamada pasta rosa. A Polícia Federal vai investigar a atuação dos ex-diretores do Banco Econômico para ver se foram cometidos crimes contra a ordem tributária e o sistema financeiro nas doações do banco a políticos nas eleições de 1990.
Exceto raras exceções, como a da pasta rosa, a maioria dos crimes constatados pelo governo nunca chega a público.
Mas que eles existem, existem. Na delegacia regional do Banco Central em São Paulo, que fiscaliza 1.991 instituições financeiras (incluindo 125 bancos comerciais e múltiplos), não faltam indícios.
Somente neste ano, a regional do BC instaurou 93 processos administrativos, examinou outros 144 e comunicou 107 crimes financeiros ao Ministério Público Federal.
À Receita Federal foram enviadas 64 comunicações de crimes fiscais. Na área cambial, envolvendo sonegação ou subfaturamento de exportações, remessas pelo "black market" e outras irregularidades, foram instaurados 25 processos até outubro passado.
"Há muitas irregularidades no mercado. Fazemos a nossa parte, descobrindo-as e punindo administrativamente as instituições e seus administradores", diz o delegado regional interino do BC, Virgínio Santos Neto. "Cabe à Justiça prosseguir com as punições dos criminosos."
No mês passado, o BC aplicou 32 penalidades em São Paulo, onde conta com 160 inspetores. No acumulado do ano, as penalidades chegam a 252, entre multas, advertências e propostas de inabilitações (suspensão do mercado financeiro). Pelo menos 15 executivos de São Paulo sofreram pedido de inabilitação pelo BC, que encaminha esses processos para instâncias superiores, em Brasília.
O delegado não divulga o teor dos processos nem a identidade dos acusados, alegando sigilo bancário. Mas os tipos de crimes cometidos são bastante conhecidos no mercado financeiro.
Há aqueles que acontecem nas agências, vitimando clientes. Outros são feitos nas mesas de operações e nas diretorias dos bancos.
Na semana passada, estourou o caso de um gerente da agência Castelo do Unibanco, no Rio de Janeiro. Fernando Poliano Tarouco Corrêa desapareceu com o dinheiro da clientela.
O Unibanco não encontrou registros das aplicações e disse, em comunicado à imprensa, que não poderia fazer nada pelos clientes lesados pelo seu ex-gerente.
Mas os crimes mais flagrados pelo BC são cometidos nas esferas mais elevadas das instituições.
O mais comum é o empréstimo irregular de dinheiro por uma instituição financeira para outra empresa do mesmo grupo. Esse tipo de operação respondeu por 27,9% dos processos instaurados este ano pelo BC contra 68 instituições financeiras sediadas em São Paulo.
O segundo crime mais praticado é a má gestão e as infrações graves, com índice de 20,6%.
O conceito de má gestão é vago, admite o delegado do BC. Mas há operações típicas que os bancos fazem para obter prejuízo, com objetivos fiscais ou de transferência irregular de renda entre uma das partes envolvidas. É a chamada "troca de chumbo" entre instituições financeiras.
"Como o objetivo das empresas privadas é a obtenção do lucro, em última análise, prejuízos fabricados caracterizam a má gestão", observa Santos Neto.

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