São Paulo, segunda-feira, 25 de dezembro de 1995
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O transatlântico BB se move

LUÍS NASSIF

Há uma certa confusão sobre o papel dos bancos públicos -particularmente do Banco do Brasil. Na semana passada, o anúncio de que o BB iria constituir uma empresa de seguro saúde gerou protestos, e foi interpretado como um retrocesso no programa de privatização.
Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. O BB é uma instituição pública que atua em nível de mercado.
Sua ação é deletéria quando não busca a rentabilidade, pratica políticas inconsistentes com seus níveis de rentabilidade, fica exposto a influências políticas ou se esconde atrás do falso álibi da "função social para descuidar-se da busca da eficiência.
O lado bom é o do banco que se propõe a disputar mercado com a concorrência, aumentando a competição e a oferta de produtos financeiros no mercado.
Nos últimos tempos, o BB montou uma empresa de capitalização -a Brasilcap-, uma de previdência privada -a Brasilprev- e, agora, a Brasilsaúde, uma empresa de seguro saúde em sociedade com a seguradora Sul América.
É apenas uma das facetas do processo de recuperação do banco, que teve início a partir deste ano, quando substituiu-se uma gestão paternalista irresponsável pela busca da profissionalização.
A nomeação de Paulo César Ximenes para a presidência do banco talvez tenha sido a principal indicação do governo FHC.
Técnico de carreira do Banco Central, Ximenes é um burocrata sério, duro, que conseguiu em pouco tempo sepultar o paternalismo suicida que marcou a administração anterior.
Jogo de cintura
A maneira atabalhoada com que se investiu contra pequenos clientes inadimplentes este ano mostra que que o banco necessita de longo aprendizado até entender que o cliente é o foco de toda empresa que atua em nível de mercado.
Mesmo assim, houve avanços significativos. Na parte dos resultados, tomou-se a decisão corajosa de explicitar os prejuízos em balanços. O próximo balanço ainda vai registrar prejuízos pesados, em função da inadimplência e da valorização do real -que penalizou seus ativos em dólares.
O banco precisou provisionar mais de R$ 2 bilhões, correspondentes a 13,4% dos créditos concedidos. A defasagem do câmbio, nos últimos 12 meses, gerou mais R$ 3,1 bilhões em perdas.
Mas, além de impedir a distribuição irresponsável de dividendos e de salários, a verdade dos números pela primeira vez criou parâmetros consistentes, para o funcionalismo pautar sua atuação.
Sem alternativas, passou-se a buscar a rentabilidade. O corpo de funcionários preparado, bem acima da média do mercado, acabou se dando conta de que a única saída será investir em tecnologia, em produtos de qualidade e em reduzir o quadro de pessoal.
Salas fechadas foram abertas, a diretoria passou a trabalhar em salas unificadas, e foram criados colegiados em todas as instâncias de concessão de crédito. É a melhor maneira de criar defesas institucionais contra futuras interferências políticas.
Ao mesmo tempo, foi criada uma nova estrutura, definindo áreas de atacado e varejo, nos mesmos moldes dos bancos privados modernos. Foi finalmente criada uma controladoria incumbida de reestruturar todo sistema de informações gerenciais.
Até o final do ano que vem, cerca de US$ 800 milhões serão aplicados na informatização do banco -que tornou-se amplamente defasada.
Vai ser necessário muito mais, para o banco perder de vez a postura imperial que sempre caracterizou suas relações com os clientes normais. Mas o transatlântico pela primeira vez mostra que está se movendo em boa direção.

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