São Paulo, terça-feira, 26 de dezembro de 1995
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Os municípios e os investimentos

LUÍS NASSIF

Até 1990, a economia fechada obedecia a uma férrea lógica política. Setores econômicos com influência política dispunham de reserva de mercado, toda forma de proteção burocrática, acesso ao crédito subsidiado do BNDES e preferência nas compras governamentais.
A abertura rompeu com essa estratificação, que foi a principal responsável pela estagnação da economia nos anos 80. Inicialmente, gerou insegurança. Depois, abriu um universo de oportunidades que permitiu a muitos grupos jovens, sem apadrinhamento político, conquistarem espaço contando unicamente com visão empresarial e capacidade organizacional.
Mas a lógica de dominação ainda não foi superada devido ao controle político sobre os sistemas de financiamento e investimento no país. Hoje em dia dinheiro é a matéria-prima de maior abundância no mundo. As políticas monetária e cambial implantadas pelo Real conseguiram um milagre do paradoxo. Numa ponta, permitiram o aumento extraordinário no ingresso de recursos externos. Na outra, restringiram amplamente o acesso a esse dinheiro por parte da economia.
Recorreu-se à mesma lógica dos anos 80. Ao empresário comum, sem influência política, taxas de crédito da ordem de 8% a 10% ao mês, e nenhum acesso a investimento. Aos setores apadrinhados politicamente, as linhas do BNDES.
Quebradeira
Em grande parte, a quebradeira de 1995 decorreu desse jogo político. Pequenas, médias ou mesmo empresas de maior porte, sem apadrinhamento político, sufocaram-se com os juros praticados pelo BC. Houvesse a bóia de salvação de aportes de investimento, a crise as teria levado a abrir capital, em um fecundo processo de modernização da propriedade.
O avanço da cidadania se incumbirá em derrogar esse poder arbitrário do governo, de definir quem deverá receber suas benesses. E o aumento das pressões acabará levando à modernização do mercado de capitais, democratizando o acesso aos investimentos.
Mesmo assim, não se pode ficar sentado aguardando a eleição de governantes mais modernos.
Fundos municipais
Um dos caminhos a ser tentado -principalmente no interior- é a montagem de fundos de investimentos municipal, destinados a aplicar recursos em empresas promissoras da região. A experiência foi tentada com sucesso em alguns municípios do Paraná.
Primeiro, há a necessidade de definir um planejamento estratégico para a cidade ou região. Com o auxílio de especialistas, monta-se um fórum que passa a identificar os setores economicamente mais promissores.
Depois, através da Associação Comercial ou órgão afim, providencia-se ampla reciclagem nas empresas candidatas aos recursos. A reciclagem passa por sistemas de informação transparentes, padronizações tipo ISO-9000, planos estratégicos e tudo o mais o que constitui o universo de uma sociedade anônima.
Nesse processo, as associações comerciais poderão recorrer à assessoria do BNDES ou desses bancos de investimento que se especializaram em prospectar setores promissores.
Paralelamente, constitui-se um fundo com poupança dos grandes e médios investidores locais. Passada a fase amalucada da política monetária, as taxas de juros dos ativos de renda fixa não poderão passar dos 15% ao ano. Para os investidores mais sofisticados, a maneira de encontrar taxas mais favoráveis será justamente investir em empresas promissoras.
Definido um modelo de investimento regional, rompe-se parcialmente com o monopólio político sobre investimentos de longo prazo, que caracteriza o modelo atual.
O modelo permitirá o crescimento autônomo de regiões, a alavancagem das empresas modernas, o início da prática associativa e da democratização do capital. O tema deveria se tornar em bandeira prioritária do municipalismo brasileiro.

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