São Paulo, terça-feira, 26 de dezembro de 1995
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Final do Brasileiro criou o neobairrismo

ANDRÉ FONTENELLE
DA REPORTAGEM LOCAL

A final do Campeonato Brasileiro deste ano deu origem a uma histeria sem igual nos últimos anos. O árbitro Márcio Rezende de Freitas, que não cometeu nenhum erro flagrante, foi vítima de um absurdo linchamento moral.
Assim como na Rússia ressurge o comunismo, a decisão brasileira ressuscitou uma ideologia que julgavam moribunda -o bairrismo, numa ponta e noutra da via Dutra.
A imprensa carioca, geralmente mais comedida, se superou neste ano. A palma do neobairrismo ficou com a primeira página de "O Globo", concluindo que "peixes morrem pela boca" e "peixes morrem na praia". Nem a revista do Botafogo faria igual.
Outro excesso foi afirmar que "a empáfia santista não resistiu à raça botafoguense". Talvez tenha havido otimismo em demasia, mas em nenhum momento houve empáfia. A rivalidade entre cariocas e paulistas é estimulante, mas não justifica esse tipo de exagero.
A imprensa paulista não ficou muito atrás, infelizmente. Um ou outro órgão ensaiou, por exemplo, associar à decisão o assassinato de um membro de um grupo de santistas, no Rio, quando o que houve foi apenas um equívoco trágico e estúpido. Ainda bem que as duas torcidas não se deixaram levar.
A choradeira santista não se justifica. Tira, até, um pouco do valor da campanha da equipe. Márcio Rezende de Freitas errou, mas é fácil gritar "cariocada!" depois de observar pela 18ª vez a repetição dos gols.
Todos os lances polêmicos foram rápidos e de difícil julgamento. A defesa do Santos não reagiu na hora do gol de Túlio. No gol santista, só uma câmera de TV flagrou o toque de Marquinhos Capixaba. E o gol invalidado de Camanducaia foi tão duvidoso que, no dia seguinte, um jornal paulista ainda afirmava que o santista estava impedido.
Insinuar roubo, nessas circunstâncias, é leviandade. Pedir a anulação do jogo serve apenas para amainar a ira de algum torcedor santista mais inconformado. Mais serenidade, senhores.
A idéia da indenização que o Santos quer cobrar do árbitro, por sua vez, é original. Se fizer jurisprudência, o Corinthians bem poderia pedir reparação pelo gol de Maurinho que deu ao São Paulo o título paulista de 1957.
O bandeirinha inglês Lynch (nome perigoso para um árbitro) não marcou impedimento no lance. Com juros e atualização monetária, o Corinthians pode angariar uma fortuna. Será que o crime já prescreveu?
Mais vale criar, para o próximo Campeonato Paulista, um seguro contra danos eventuais causados por decisões de arbitragem. Mais ainda vale esquecer esta decisão e pensar na próxima competição.

Hoje, excepcionalmente, não publicamos a coluna de Matinas Suzuki Jr

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