São Paulo, quinta-feira, 28 de dezembro de 1995
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Guerra ao contrabando

SYNÉSIO BATISTA DA COSTA

Se há algo que mata todo o esforço da indústria nacional por ser competitiva é o contrabando. Esse problema, que vem se agudizando nos últimos anos, somente agora está sensibilizando devidamente os mais altos escalões do governo.
Porque, quando se fala em proteção comercial, há um arsenal de armas sofisticadas utilizadas com maestria pelos países do Primeiro Mundo, nas quais o Brasil também está se iniciando. Mas, quando o assunto é contrabando, dá a impressão de que estamos entrando numa guerra utilizando apenas armas do tempo das diligências.
Para ter uma idéia do prejuízo devastador ocasionado, vejamos o que ocorre no segmento formado pelas indústrias de produtos eletrônicos, eletrodomésticos, bebidas, cigarros, brinquedos, perfumes, transportes e seguros. Juntos, esses setores deixam de faturar US$ 1 bilhão por mês devido ao contrabando. O custo social direto é alto: se o problema fosse eliminado, esses setores poderiam criar imediatamente 70 mil postos de trabalho.
Infelizmente, os prejuízos do contrabando vão mais além. Milhões de reais em impostos federais, estaduais e municipais deixam de ser arrecadados. Retira-se competitividade da indústria, que é forçada a reduzir a escala de sua produção. Esvazia-se o comércio, tanto de produtos nacionais como daqueles importados legalmente. Prejudica-se o consumidor, que acaba adquirindo produtos de origem duvidosa, sem certificado de garantia e assistência técnica.
Em governos passados, havia quem previsse que o contrabando iria diminuir à medida que as alíquotas de importação fossem baixando. O raciocínio era simplista: ficaria tão barato importar legalmente que os contrabandistas prefeririam legalizar seu negócio e tornar-se importadores com endereço conhecido, CGC etc.
Ocorreu exatamente o contrário. Em 1989, quando a alíquota do Imposto de Importação girava em torno de 105%, o contrabando era localizado em certos itens e muito pequeno. À medida que as alíquotas iam caindo, o contrabando aumentava. No ano passado, quando a alíquota média modal chegou aos atuais 15%, o contrabando saltou para bilhões de dólares.
Para este ano, apesar da declarada guerra da Receita Federal ao contrabando, a estimativa é de novo salto.
Os números mostram que o contrabando não tende a diminuir com a diminuição da alíquota ou a redução da cota. Ele aumenta principalmente porque, em época de crise social, o crime se torna mais organizado e ousado. Com o contrabando não é diferente; portanto, a redução de cota precisa ser acompanhada de forte pressão de fiscalização.
Além disso, em muitas regiões, os controles aduaneiros ainda deixam a desejar. Nos grandes centros urbanos, a fiscalização federal, estadual e municipal não dá conta de coibir as atividades de milhares de pequenos e grandes contraventores.
Em algumas localidades, como no Distrito Federal, o próprio governo forneceu condições para os contrabandistas trabalharem, instalando-os na "Feira do Paraguai -nome prosaicamente dado a um camelódromo que funciona a um quilômetro dos gabinetes do presidente da República e do ministro da Fazenda. Continuam lá, a despeito de reconhecidos esforços da Receita Federal.
Reconhecemos que o Paraguai tem dado demonstrações de boa vontade. Contudo, na prática, ainda não se podem sentir resultados.
Uma última e importante medida que a Receita e o Itamaraty poderiam acertar seria a obrigatoriedade de desembaraço das importações paraguaias unicamente pelo porto de Santos, pois tudo leva a crer que é mais rigoroso.
Vejamos: de setembro/94 a setembro/95 desembarcaram em Paranaguá, com destino a Ciudad del Este, 13.543 contêineres, de valor declarado da ordem de US$ 223 milhões (uma ninharia pela quantidade de contêineres). Em Santos, no mesmo período, esse número ficou em 4.433 contêineres, no valor de US$ 240 milhões. Há algo de irregular nas importações do Paraguai via Paranaguá.
Por todas essas razões, o país precisa de uma proteção comercial, fiscal e de saúde pública contra os brinquedos contrabandeados. E isso somente será obtido se as autoridades se armarem devidamente para a guerra.

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