São Paulo, domingo, 31 de dezembro de 1995
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Economia criou vítimas e ganhadores durante o ano

CRISTIANE PERINI LUCCHESI; MALU GASPAR; FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

A passagem do primeiro ano do governo Fernando Henrique Cardoso afetou a vida de muitas pessoas, tanto positiva quanto negativamente.
Por um lado, houve ganho real de salário em diversos setores da classe mais baixa, devido ao fim da ciranda financeira -na qual os mais ricos aplicavam seu dinheiro para evitar a corrosão pela inflação.
Joaquim Vieira da Silva, 38 anos, conseguiu mais do que dobrar seu salário desde o início do Plano Real. Ele trabalha como encarregado em uma empresa prestadora de serviços para a metalúrgica Asea Brown Boveri, de Osasco, São Paulo. Segundo Silva, seu salário saltou de R$ 92 na metade do ano passado para R$ 195.
Casado, com três filhos, Silva mora em um terreno da prefeitura no Jardim de Abril, em São Paulo, e não paga aluguel. "Antes do plano, o que sobrava a gente punha na poupança, que dava muito dinheiro. Hoje, é melhor comprar."
Vítimas
Mas o ajuste baseado na rigidez monetária causou suas vítimas. São Paulo fecha o ano com cerca de 150 mil pessoas desempregadas, segundo a Fiesp.
No dia 16 de dezembro, o controlador de programação Marcos Cardoso dos Santos, 34, recebeu um telex-surpresa em sua casa, no ABCD paulista.
A Cofap, empresa de autopeças na qual ele trabalhava havia 11 anos, decidiu demiti-lo.
"É humilhante ser demitido às vésperas do Natal", diz Santos.
Casado, pai de dois filhos, Santos não se desespera. Com o salário de R$ 1.000 por mês que ganhava na Cofap e mais "muita hora extra", Santos conseguiu comprar sua casa, mas ainda paga R$ 60 de prestação por mês. Ele conta com o dinheiro da indenização.
Micro e comércio
As microempresas também foram afetadas. "Falta uma política para a pequena indústria. O setor gerou 63 mil empregos desde o Real e ainda não encontra condições de recursos pela dificuldade de obter crédito, afirma o presidente do Simpi (Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Estado de São Paulo), Joseph Couri.
Situação semelhante vive o comércio, afetado também pela política cambial. "Já passei por vários planos econômicos, mas este não deu para aguentar", diz Karitas Ferreira, que está fechando sua loja de jóias depois de 30 anos.
Karitas diz que perdeu muito dinheiro com o Real porque as mercadorias da loja, que leva seu nome e fica na rua Augusta (zona oeste de São Paulo), têm preço em dólar. A desvalorização da moeda norte-americana frente ao real reduziu os ganhos.
A dois quarteirões da Karitas, porém, uma loja não parou de vender mesmo depois do Natal. Para a Blow Up da rua Oscar Freire, o Plano Real só ajudou.
Pelo menos é o que diz a gerente da loja, Suemi Matsuzaki, que acha que o segredo para vender bem em época de recessão é baixar os preços.
"Este ano não compramos roupas de lã e não praticamos preços acima de R$ 200. O resultado é que tivemos vendas equilibradas durante o ano todo", diz Suemi.
Outros setores
A agricultura é outro setor fortemente influenciado pela política econômica. Com restrições de linhas de crédito, muitos agricultores ficaram sem conseguir financiar a safra. Acordo político entre a bancada de parlamentares ruralistas no Congresso e o governo garantiu, no fim do ano, a securitização da dívida e deve aliviar a situação em 1996.
Outros setores sofreram ainda com questões específicas da política econômica, como os de calçados, têxteis e automóveis (leia textos abaixo).
(Cristiane Perini Lucchesi e Malu Gaspar)

Colaborou FREDERICO VASCONCELOS, editor do Painel S/A

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