São Paulo, segunda-feira, 6 de fevereiro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

História dos Lumière é tema de exposição

Cinematógrafo foi apenas uma etapa

AMIR LABAKI
ENVIADO ESPECIAL A LYON

Lyon, fevereiro de 1895: os irmãos Louis e Auguste Lumière registram oficialmente a patente da invenção do cinematógrafo. Lyon, fevereiro de 1995: o velho castelo da família, transformado no Instituto Lumière - Museu Vivo do Cinema, dedica uma grande exposição a seus mais célebres donos.
"No País dos Lumière", em cartaz até janeiro de 1996, transcende a celebração do nascimento do cinema. É sobretudo uma viagem à história de uma dinastia de industriais obcecados pela ciência.
Antoine Lumière, o pai de todos, já era em 1894 Cavaleiro da Legião de Honra, à frente dos negócios com fotografia que ocupava o clã. Em plena febre internacional de pesquisa da foto em movimento, os Lumière concentravam suas energias no desenvolvimento da fotografia colorida.
Conhecendo os trabalhos de Muybridge, Edison e Marey, Louis e Auguste decidem pesquisar a chamada cronofotografia. Alcançaram excelentes resultados: aparecia o cinematógrafo.
Muito longe do mito dos cientistas românticos, o perfil dos Lumière que surge da exposição é o de industriais de inequívoco talento científico e um nada menor tino comercial.
"Edison cometeu um só erro, o de não confiar na rentabilidade das projeções públicas", editorializa o texto da pequena, mas riquíssima sala que a mostra dedica ao pré-cinema. Lá está o pioneiro kinetoscópio de Thomas Edison, que apresentava imagens em movimento numa caixa com abertura de alguns centímetros; diversão solitária, para uma pessoa por vez.
O grande achado dos Lumière foi o de aperfeiçoar o registro da imagem em movimento (cinematógrafo) e imediatamente inserir seu invento na ascendente indústria do espetáculo (cinema). Mais que a máquina, foi a situação-cinema, com a projeção de imagens em movimento para espectadores pagantes confortavelmente sentados numa sala escura, que os imortalizou.
A estratégia inicial foi precisa: março a novembro de 1895, sessões científicas pela França; dezembro de 1895, início das projeções comerciais em Paris, numa sala específica; 1896, envio de operadores para projeções e filmagens mundo afora.
O cinematógrafo Lumière foi assim o estopim da explosão planetária do cinema, mas aquela mediana empresa familiar do interior da França não soube responder com igual eficiência ao desafio deste megamercado. Já em 1905, os Lumière paravam a produção de filmes e, três anos depois, fechavam a última sala.
Causas? Entre várias, a dedicação exclusiva dos Lumière a um único tipo de produção, a de documentários, deixando livre a avenida da ficção para Méliès, Pathé e Gaumont; e a perda do mercado americano, devido ao protecionismo tornado lei a partir de 1896 pelo presidente MacKinley. Há outra, mais sutil mais pessoal, talvez a mais decisiva: o incontrolável desejo de pesquisa dos irmãos.
Alguns meses após a sessão mítica de dezembro de 1895, Auguste já desviava suas atenções para os estudos médicos, tornando-se, mesmo sem diploma, um renomado especialista, diretor de hospitais e inventor.
Louis tampouco parou. Vai dedicar o resto de sua vida a pesquisas fotográficas, com um ou outro desvio para o cinema. Desenvolveu o autocromo e a foto em 360 graus, prenunciou o holograma com seus impressionantes retratos tridimensionais em "fotoestereosíntese" e lançou em 1935 o protótipo do cinema em relevo, tudo fartamente exemplificado na exposição.
Numa tardia homenagem na Sorbonne, o próprio Louis sintetizou o lema de sua vida: "Como ficar inerte na presença da floresta de pontos de interrogação que nos rodeia?" Explicava assim o fato de o cinema representar apenas um dos momentos de sua profícua trajetória.
Não surpreende que o mesmo valha para a história. No século 19, a cronofotografia se fez cinematografia que resultou cinema. Neste século, a evolução prossegue com a TV, o vídeo e agora as imagens de síntese. Nada como uma efeméride para reconhecer o fim de um ciclo.

Texto Anterior: Novas séries estréiam nos EUA
Próximo Texto: Retrospectiva e exposição mostram trabalhos do cineasta em Nova York
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.