São Paulo, terça-feira, 7 de fevereiro de 1995
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O escândalo é o de menos

JANIO DE FREITAS

Duas convicções sobressaem na repercussão que o novo escândalo motivado por empreiteira, no caso a baiana OAS, alcançou nos meios políticos, a partir da reportagem assinada por Joaquim de Carvalho e William Waak, na revista "Veja". A primeira consiste na conclusão de que o material foi proporcionado, não por Cecílio do Rego Almeida, empreiteiro adversário da OAS, mas pelo governo. A segunda é a convicção de que o material foi liberado com finalidades políticas.
O propósito político suscita, porém, explicações divergentes. E ambas possíveis, além de conciliáveis em certa medida. Para uma corrente, o governo lançou mão agora de descobertas feitas desde dezembro, sobre as contas exteriores da OAS com sonegação dos impostos, para desviar as atenções críticas voltadas para Fernando Henrique Cardoso, e às quais é atribuída a queda recordista do seu prestígio.
Outra corrente considera que o alvo político é o senador Antônio Carlos Magalhães, sogro de um dos donos da OAS, Cesar Mata Pires. Consumada a eleição de seu filho, Luís Eduardo Magalhães, para a presidência da Câmara, encerrou-se o período de (quase) silêncio do senador, motivado pela conveniência de não criar animosidades antes daquela eleição. Indireto, mas contundente, o ataque expresso pela liberação das informações pretenderia conter de imediato o senador, cujas primeiras investidas contra o ministro das Comunicações, Sérgio Motta, obtiveram ressonância e já alcançaram o próprio presidente.
Os dois repórteres cuidaram de resguardar a procedência das informações sobre a dinheirama remetida ao exterior pela OAS. O necessário uso de documentos apreendidos pela Polícia Federal, há quase dois meses, autoriza, no entanto, a dedução de propósitos políticos do governo. E mesmo que o fornecedor tenha sido, por exemplo, um delegado agindo por iniciativa sua, nos meios políticos vai ficar a convicção de finalidade política. Como tudo em política gera desdobramento político, o que seria apenas mais um escândalo de empreiteira tende a ser algo mais novo: ou, pela primeira vez, Antônio Carlos Magalhães recuará de um confronto, ou abrirá com seus seguidores, nas forças partidárias do governo, uma fonte de problemas. Assim tão cedo, seria outra novidade recordista de Fernando Henrique, e não menos inconveniente do que a revelada pelas pesquisas de opinião pública.
O governo não deixou, por seu lado, de dar uma pista da dimensão política conferida ao caso da empreiteira. À parte os motivos alegados publicamente para sua viagem ao Rio, ontem, o ministro Sérgio Motta teve um encontro não divulgado com o presidente das Organizações Globo, Roberto Marinho. Não é preciso, a respeito, mais do que lembrar a solidez que as relações entre os Marinho e Antônio Carlos têm demonstrado.
E sobre a sonegação, as remessas ilegais de dinheiro para o exterior, as empresas-fantamas da OAS? Como se deu com as empreiteiras que abasteceram o esquema PC-Collor, a OAS pagará umas quantas multas, usando pequena parte dos lucros auferidos com as práticas ilegais. E pronto. As consequências de processos criminais ficam para aplicação em gente miúda.

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