São Paulo, terça-feira, 7 de fevereiro de 1995
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Comédia muda triunfa em mostra histórica

AMIR LABAKI
ENVIADO ESPECIAL A CLERMONT-FERRAND

Na primeira grande retrospectiva de celebração do centenário do cinema em festivais franceses, 102 mil pessoas bateram o recorde de público no 17º Festival do Curta-Metragem de Clermont-Ferrand, encerrado na madrugada de anteontem, confirmando-o como o segundo maior do país, logo após Cannes, e o primeiro na categoria curta do mundo.
O ciclo "Um Século de Curtas", que reuniu os cem filmes mais importantes do gênero, confirmou as expectativas e se tornou até aqui o principal evento francês de comemoração da efeméride.
A seleção de títulos referendou plenamente as duas linhas centrais assumidas pela curadoria, como as definiu o organizador Antoine Lopez: uma política de autores e uma política de revelações. Se a primeira trouxe a Clermont-Ferrand os filmes mais aguardados, encontraram-se na segunda as escolhas de maior destaque num balanço final.
A comédia muda imperou nas descobertas. O americano Charles Bowers (1884-1945) abre a lista. Virtualmente desconhecido, Bowers parece um dos nomes que faltam no Olimpo formado por Chaplin, Buster Keaton, Harold Lloyd e Stan Laurel-Oliver Hardy.
Seu personagem Bricolo, protagonista da mostra de "Egged On" (1925), satiriza com humor fino o deslumbre pela sociedade industrial tematizado em muitos dos filmes de Lloyd e sobretudo pelo Chaplin de "Tempos Modernos".
Outro americano subestimado: Roscoe Arbuckle (1887-1933). Seu simpático "Fatty", rebatizado Chico Bóia no Brasil, lhe garantiu ampla popularidade inicial, mas um escândalo sem precedentes na nascente Hollywood, envolvendo orgias e um estupro seguido de morte, estigmatizou-o de 1921 até muito depois de sua morte.
"Nos Bastidores" (Backstage, 1919), um tesouro recém-redescoberto, começa a resgatá-lo para as novas gerações. É um delicioso curta sobre a montagem de uma peça teatral dirigida e estrelada pelo próprio gorducho Arbuckle, tendo a seu lado ninguém menos que Buster Keaton.
A mostra reafirmou a variedade dos pequenos filmes dos grandes mestres. Robert Bresson e Jacques Tati estrearam no cinema com curtas ainda hoje de raro frescor. "Assuntos Públicos" (1934) surpreende ao revelar Bresson através de uma corrosiva sátira às convenções políticas. Já "A Escola dos Carteiros" (1946), sexto curta de Tati, o caracteriza como gênio cômico em estado bruto.
Bastante distinta foi a circunstância em que Alfred Hitchcock e John Ford rodaram seus curtas presentes no ciclo. "Boa Viagem" (1944) foi feito por Hitchcock na Inglaterra, mas rodado em francês, dentro do esforço de propaganda de guerra.
Por fim, John Ford esbanja destreza narrativa em "A Revelação do Ano" (1955), feito para a TV. Os vários níveis temporais da história vão se interceptando para apresentar sucintamente a busca por um jornalista (John Wayne).

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