São Paulo, terça-feira, 7 de fevereiro de 1995
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Literatura explícita

HÉLIO SCHWARTSMAN

Na edição de ontem, a Folha publicou um interessante texto sobre os livros que ajudam a entender melhor o governo de Fernando Henrique Cardoso. Aproveito a deixa para também indicar algumas obras que, acredito, podem ser úteis para a compreensão dos percalços que cercam a atual gestão.
Os que estiverem interessados em analisar melhor a trajetória do presidente podem ler o "Fausto" do imortal Goethe. É a história de um sábio que vende a sua alma ao demônio (o PFL, tesconjuro, pé de pato mangalô três vezes) em troca de poderes especiais (a Presidência). Uma outra boa indicação sobre o mesmo tema é "Pacto Sinistro", o livro de estréia de Patricia Highsmith, morta no último sábado.
Quem estiver encontrando dificuldades para entender as complexas relações de FHC com o Congresso tem uma miríade de boas obras à disposição: "Sodoma e Gomorra" de Marcel Proust, "O Banquete" de Platão, "Leviatã" de Thomas Hobbes e as não menos importantes "Memórias de uma Casa Assassinada" de Lúcio Cardoso.
No capítulo Previdência Social há uma obra fundamental. É "Crime e Castigo" de Dostoiévski. Conta a história de um sujeito metido a intelectual que premeditadamente assassina uma velhinha. Também seria instrutiva a leitura de "Almas Mortas" de Nikolai Vassiliévitch Gogol. Neste livro, o herói sai pela Rússia comprando a titularidade de servos mortos desde o último censo (fantasmas) para criar uma propriedade imaginária que pretende penhorar, para o governo naturalmente.
Os que andam ocupados com o impacto da crise mexicana encontrarão lições valiosas na leitura de "A Divina Comédia" de Dante. O autor nos leva numa comovente viagem do inferno (os pobres mexicanos que viram sua moeda perder mais de 40% de seu valor da noite para o dia) até o paraíso (os investidores que terão suas perdas ressarcidas pelos governos de diversos países, o Brasil inclusive).
Aliás, a súbita generosidade do governo FHC nos remete a "Um Conto de Natal" de Charles Dickens. É a história de um velhinho sovina, do tipo que se recusaria a conceder um aumento para o salário mínimo, que, depois de ser visitado por três fantasmas, fica repentinamente mão-aberta, sendo até mesmo capaz de sair em socorro de investidores estrangeiros.
Quem anda preocupado com o alcance da âncora cambial e o seu fôlego encontrará nas páginas de Milton ("Paraíso Perdido") a resposta para todas as suas dúvidas e inquietações.
Pessoas que preferem obras mais gerais, que dêem conta de descrever acuradamente o quadro social do país, acharão "Os Miseráveis" de Victor Hugo uma obra irretocável.
Já para os "fracassomaníacos", aqueles que abandonaram todas as suas esperanças em relação à realização das promessas de campanha, proponho uma leitura mais leve, alternativa até: "À Margem do Rio Piedra Eu Sentei e Chorei" de Paulo Coelho.

Helio Schwartsman é editor de Opinião da Folha.

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