São Paulo, domingo, 12 de fevereiro de 1995
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Impulso potencia circuitos cerebrais

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Nestes últimos tempos, tem merecido muita atenção dos neurocientistas o fenômeno chamado de potenciação a longo termo (LTP), que implica o reforço das sinapses que articulam entre si os neurônios (células nervosas).
Ela pode ser fundamental, entre outras coisas, para o desenvolvimento do cérebro e o armazenamento da memória.
As articulações entre os neurônios operam-se entre milhares de prolongamentos celulares cujas extremidades todavia não se fundem mas deixam entre si espaços (sinapses) onde se passam reações químicas e que são atravessados pelos sinais que, vindo de um dos prolongamentos (pré-sináptico), vão excitar o prolongamento contíguo (pós-sináptico).
Tem-se considerado como fato bem estabelecido a estrita especificidade da LTP, que só seria capaz de captar e reforçar uma sinapse dentre os milhares delas que existem num neurônio.
Mas essa noção foi contestada por experiências de Dan Madison e Erin Schuman ("Science", 263, 532), que revelaram que a LTP pode ser espalhada a sinapses vizinhas, de outros neurônios, por um sinal divisível, provavelmente o óxido nítrico, neurotransmissor gasoso bem conhecido.
A descoberta dessa difusão foi saudada com muito entusiasmo por outros especialistas, que consideram bem demonstrada a transferência da potenciação por meio de mensagem difundida.
A LTP não foi todavia descoberta por Madison e Schuman, pois em 1989 Tobias Bonhoeffer e colaboradores, de Tubingen, Alemanha, já haviam demonstrado que a LTP pode ser detonada numa única sinapse pela estimulação simultânea de neurônios pré e pós-sinápticos.
Mas o trabalho alemão foi relegado porque na época dominava a noção da estrita especificidade da LTP.
As pesquisas de Madison e Schuman vieram logo depois e revelaram ainda que o NO (óxido nítrico) pode ser o "sinal retrógrado" que, tanto quanto se sabia, é produzido pelo neurônio pós-sináptico durante a LTP e se difunde retroativamente para a célula pré-sináptico, reforçando a sinapse específica.
Madison e Schuman observaram que, bloqueando a produção do óxido nítrico numa sinapse específica, esta continua sendo reforçada desde que outras, na vizinhança, estejam sofrendo a LTP.
O NO dessas sinapses poderia, ao que tudo indica, salvar a sinapse cuja produção de NO foi bloqueada.
Prosseguindo em suas experiências, eles descobriram que, ao bloquear a produção do NO no neurônio pós-sináptico, bloqueavam ao mesmo tempo o reforço das sinapses vizinhas.
Outros experimentos patentearam que o NO —ou também o CO (monóxido de carbono)— só reforça as sinapses que já estejam recebendo impulsos nervosos.
A capacidade da potenciação de se espalhar somente a sinapses ativas parece útil para o refinamento das conexões nervosas no cérebro embrionário.
Este nasce de um número muito maior de células do que o necessário para modelar o desenvolvimento do órgão.
Assim se explica o processo de "poda" por que a estrutura passa. E assim de fato acontece, parecendo o NO funcionar como determinante dos neurônios que devem permanecer.

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