São Paulo, terça-feira, 14 de fevereiro de 1995
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Milho de alta qualidade protéica

PAULO EVARISTO DE OLIVEIRA GUIMARÃES
A desnutrição é um dos mais sérios problemas do Brasil. É opinião corrente que sua solução é complexa e depende da participação de todos os segmentos da sociedade.
Dentro deste enfoque, pode-se afirmar que uma das maiores contribuições que a pesquisa agropecuária tem a oferecer é o desenvolvimento de tecnologias para a produção de alimentos baratos, nutritivos e de fácil produção e aceitação para consumo.
O milho é um alimento que já preenche os pré-requisitos mencionados por ser barato, altamente energético, produzido e consumido em todas as regiões brasileiras.
A produção anual deste cereal está em torno de 30 milhões de t, que fornecem cerca de 2,6 milhões de t de proteínas. Entretanto, essas proteínas são de baixo valor biológico, por apresentarem baixos teores de dois aminoácidos essenciais: a lisina e o triptofano.
Em 1964, pesquisadores da Universidade de Purdue, nos EUA, descobriram que um mutante de milho, "opaco 2", apresentava grãos com níveis bem maiores de lisina e triptofano, aumentando o valor biológico da proteína do milho de cerca de 40% para 90% da proteína do leite.
Contudo, apesar de inúmeros trabalhos comprovando o maior valor nutricional deste mutante na alimentação humana e de animais monogástricos, as cultivares de milho "opaco 2" não foram aceitas pelos agricultores por apresentarem algumas características agronômicas indesejáveis.
O Centro Internacional de Melhoramento de Milho e Trigo, CIMMYDT, no México, em um programa de melhoramento genético de 13 anos, conseguiu superar os problemas associados ao "opaco 2" e desenvolveu variedades de milho denominadas "Quality Protein Maize" (PPM), tão produtivas quanto às de milho comum, apresentando grãos de mesmo valor energético e com proteína de maior valor biológico.
Estudos de nutrição infantil, conduzidos no Peru, demonstraram que crianças com dois anos de idade desenvolveram-se normalmente quando alimentadas em dietas com milho QPM como única fonte de proteína. Segundo os autores, o milho de alta qualidade protéica pode vir a ser um importante suplemento ao leite materno e também um alimento de grande valor para crianças desnutridas.
Em 1983, a Embrapa/CNPMS começou a investir no desenvolvimento de milho QPM para as condições do Brasil. Neste programa está envolvida uma equipe multidisciplinar de pesquisadores. Em 1988, foi lançada a primeira variedade QPM no Brasil: BR 451. Esta variedade é produtiva, precoce e apresenta grãos brancos de alta qualidade protéica que, quando moídos, fornecem um fubá excelente para ser utilizado na fabricação de pães e massas.
Com a intenção de ampliar a área de plantio e consequentemente a produção e o consumo direto e indireto de milho QPM, a Embrapa está desenvolvendo variedades e híbridos QPM com a tradicional cor amarela.
Nesta safra, está sendo lançada no mercado uma nova variedade, BR 473, que é tão produtiva quanto a variedade precoce comum e deve ser produzida com as mesmas técnicas que os agricultores já estão acostumados a utilizar. Seus grãos amarelos possuem cerca de 50% a mais de lisina e triptofano e fornecem alimentos e rações com aparência e sabor similares ao milho comum.
Através de ensaios biológicos com ratos, pesquisadores da Embrapa e da Unesp de Botucatu relataram que a qualidade protéica dos grãos das variedades BR 451 e BR 473 corresponde, respectivamente, a 86,3% e 85% da caseína. Segundo os autores, a substituição do milho normal por QPM pode contribuir para reduzir a prevalência da desnutrição e da pelagra em populações onde o milho é um importante componente da dieta.
Devido ao seu maior valor biológico, a proteína de milho QPM também é melhor aproveitada pelos organismos de animais monogástricos como suínos, aves, peixes e equídeos. Entretanto, o efeito da utilização de milho QPM dependerá do tipo de animal, fase de desenvolvimento e qualidade da ração fornecida.
Quando a esses animais forem oferecidas rações de baixos níveis de concentrado protéico, provavelmente haverá maior ganho de peso, substituindo milho comum por QPM. Pesquisas preliminares conduzidas pela Epamig revelaram ganhos de 41% e 44%, respectivamente, para suínos nas fases inicial e de crescimento, alimentados com milho QPM em rações sem suplemento protéico, o que implicará na redução do custo das rações.
Híbridos experimentais QPM também estão sendo desenvolvidos e avaliados. O lançamento do primeiro híbrido QPM, com alto potencial de produção e competitivo com híbridos normais, está previsto para a safra 1996/97.
Com o gradual aumento na oferta de sementes e consequente produção de grãos de milho de alta qualidade protéica, há uma grande probabilidade da sociedade vir a investir mais na sua utilização e se beneficiar de suas vantagens nutricionais.

PAULO EVARISTO DE OLIVEIRA GUIMARÃES, melhorista de plantas, é pesquisador da Embrapa/Centro Nacional de Pesquisa de Milho e Sorgo - Sete Lagoas/MG.

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