São Paulo, quarta-feira, 15 de fevereiro de 1995
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Zagalo chama apenas mais uma seleção

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Pensei cá comigo, cacofatando com meus botões: se eu fosse o Zagalo, não chamaria os estrangeiros para esse amistoso contra os eslovacos —engraçado, é a primeira vez na minha vida que escrevo essa palavra; tenho a sensação de que está pela metade (aliás, está mesmo). A propósito, a partir desse jogo vamos poder avaliar quais eram os bons de verdade —os tchecos ou os eslovacos. Sim, porque no futebol é assim: o sujeito nasce deste lado do rio e é cobra; do outro, um cabeça-de-bagre. Lembram-se dos tempos da Alemanha dividida? Pois a Ocidental era uma fera; a Oriental, um desastre. Misturaram de novo, e foi aquela tragédia na Copa dos EUA. Puro mistério.
Então, voltando à nossa indissolúvel e homogênea confederação, comecei a escalar a seleção, que não seria do Zagalo, embora fosse, e logo embatuquei na lateral-direita. Sabe o amigo leitor que não há um só craque atuando por aqui nessa posição?
Assim, curvei-me à decisão de Zagalo de chamar pelo menos nosso velho Cafu. Mas reaprumei-me imediatamente ao ouvir no rádio o nome de Doriva, chamado para compor o mais nobre dos setores de uma equipe de futebol.
Não diria que está nascendo um novo Dunga, em respeito a Dunga, que, afinal, dá seus passes de trivela e que possui um chute respeitável de direita. Doriva é apenas um esforçado cabeça-de-área, como centenas que se espalham por nossos campos oficiais e de várzea.
Esse, por exemplo, não é o caso de Leandro, médio do Vasco, que há muito tempo merecia uma atenção especial do selecionador de plantão. Esse moço tem um senso de colocação invejável, e, quando de posse da bola, sabe o que faz.
Mais adiante, topo com Túlio, sobre quem, perguntado na TV se considerava o centroavante ideal para o São Paulo, respondi que não. Insisto, para o esquema do tricolor, volátil e escorregadio, Bentinho, mais técnico, encaixa-se melhor. Mas, para a seleção, uma seleção parruda (eu disse parruda, não parreira) como essa, não havia como deixar de convocar o artilheiro do último brasileiro e do Campeonato Carioca. O rapaz, afinal, fez por merecer a convocação, embora quem vá jogar —se quiser— será mesmo Romário.
Aliás, por falar em Romário, vi suas três apresentações pelo Fla, e, confesso, não me decepcionei. Isso porque sei bem que Romário é um fenômeno de uma só jogada: metam-lhe a bola, ainda que enviezada, vesga e cheia de calombo entre os beques, na linha da área, e ele consegue o efeito mágico de arredondá-la, amaciá-la, mantê-la distante dos pés afoitos inimigos, e ela seguirá, obediente, em direção às redes. Nada mais exijam, pelo amor de Deus de Romário. Acontece que o meio-campo do Fla é um deserto tão árido de idéias e talento que a bola não chega nele nunca. Assim, não há Romário que aguente, gente.
Bem, de qualquer forma, aí está nossa seleção. uma seleção que não entusiasma nem provoca indignação. Apenas mais uma seleção.

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