São Paulo, sexta-feira, 17 de fevereiro de 1995
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Desgaste

SÍLVIO LANCELLOTTI

João Havelange se transformou no presidente da Fifa, mais de duas décadas atrás, com o apoio integral do chamado terceiro mundo. Desde então, se sustentou no poder máximo do futebol graças ao suporte do terceiro e até do quarto.
A compensação por tal sustento de votos já se conhece. O futebol se universalizou e os países da Ásia, da África e da Oceania desandaram a promover torneios vários, inclusive aqueles planetários de infantis, de juvenis e de juniores.
Paralelamente, a África ganhou três vagas na Copa de profissionais. A Ásia subiu a dois o número dos seus participantes. Quantidades, aliás, de novo ampliadas, com a devida antecipação, para a competição da França, em 1998.
Correu tudo muito bem em eventos menores já organizados na bilionária Arábia Saudita, na Austrália rica em infra-estrutura, no Japão da tecnologia de ponta. Agora, todavia, a Fifa se depara com um problema lancinante, a Copa de Juniores, originalmente marcada para a Nigéria, na África, no final do próximo mês de março.
O torneio está suspenso, supostamente, por causa de uma epidemia de meningite e outra de cólera, males terríveis num país cheio de petróleo mas, através das ditaduras militares, incapaz de solucionar a questão básica da higiene e do saneamento.
Uma comissão da Fifa, cartolas bem fornidos e devidamente vacinados, viaja nestes dias à Nigéria para constatar, no local, ao vivo e em cores, a extensão eventual do problema e as suas consequências nas delegações dos visitantes.
Parece óbvio que a Fifa, neste caso, apenas age politicamente. Quer dar alguma espécie de satisfação à federação da Nigéria e ao presidente da federação da África, o melífluo camerunês Issa Hayatou, hoje mais inclinado em se aliar com a Europa e com a sua Uefa na batalha pela sucessão-tampão de Havelange em 1996.
Na última reunião do Comitê de Urgência de entidade (Havelange, Hayatou e mais Guillermo Cañedo do México, Júlio Grondona da Argentina, Lennart Johansson da Suécia e da Uefa, Jacques Georges da França e ex-Uefa, Harnzan Tan Sri Datyk da Malásia), os europeus fecharam com o africano na idéia da exigência da visita.
Pressão brilhante a de Johansson e companhia. Quase com certeza, a não ser que Havelange esteja louco, a comissão de cartolas perceberá a impossibilidade de se montar, atualmente, qualquer espécie de evento na Nigéria. A Fifa precisará, então, confirmar a suspensão da Copa de Juniores e, no processo, sofrerá um gigantesco desgaste, de impensáveis desdobramentos eleitorais.

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