São Paulo, sexta-feira, 17 de fevereiro de 1995
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Refinaria e pão da boca de cego

JOSÉ SARNEY

Confesso que não me seduz nenhuma forma de destruição da Petrobrás. Mas é necessário que a Petrobrás tenha consciência de que não pode mais dar ao país derivados do petróleo a custos que não sejam os custos internacionais, sob a invocação dos ideais que são daqueles que lutaram por sua implantação.
Exemplo dessa conduta grosseira e inaceitável é o que está ocorrendo com a implantação de uma nova refinaria.
Como uma empresa de grande porte, a Petrobrás deve ter um planejamento e capacidade técnica capaz de saber quando, em que tempo e em que lugar deve expandir o seu parque de refino, assim como as previsões de recursos.
É inconcebível que a Petrobrás, agora, quando está em discussão o problema da flexibilização do monopólio, arme uma arapuca política, para obter a adesão dos Estados mais pobres do país, que são os do Nordeste, e entre eles jogar a cizânia e a disputa, pedindo vantagens, como se fosse aceitável que um investimento de um bilhão e meio de dólares dependesse de um terreno, de uma linha de transmissão, de redução dos impostos estaduais e municipais para que ela tenha melhores resultados e competitividade.
Seria passar um atestado de ingenuidade aceitar isso como uma conduta correta.
Cubatão, Mataripe, Paulínia, unidades construídas em região rica, impuseram essa conduta matreira de colocar em concorrência não tecnologias e capacidade, mas a miséria de Estados pobres, que estão abdicando de recursos que seriam destinados a combater a fome, a melhorar a educação e a saúde, só para que a Petrobrás, que é nossa, tenha condições de "construir uma refinaria".
E o presidente da República está sendo levado espertamente para a posição de expert de petróleo e de quem deve saber onde, politicamente, há de estar uma refinaria. Para que então estudos técnicos?
Ou a Petrobrás é capaz de definir suas prioridades, necessidade de expansão, escolha de localização com melhores condições de competitividade, ou ela é uma empresa que confessa suas deficiências, adotando manobras primárias para angariar apoios políticos.
Nada afeta a Petrobrás, já que ela se confessa incapaz e sem recursos para fazer a refinaria, necessitando das benesses de Estados aos quais ajuda em detrimento de populações que nesses mesmos Estados estão pedindo comida.
Por que não abrir concorrência pública para quem quiser montar, com seus próprios meios e sem esses expedientes, refinarias que produzam gasolina e outros derivados mais baratos do que ela produz atualmente? A própria Petrobrás poderia concorrer —e vencer— sem recorrer a tais expedientes, sem dividir o Nordeste.
Com base em um estudo correto, que já existe na Petrobrás, ninguém deixaria de colocar uma refinaria no Maranhão, onde a empresa sabe que, tecnicamente, é o lugar mais adequado para a instalação da refinaria. Agora, estranhamente, alimenta um conflito de interesses, passando a solução do caso para essa história de escolha política, fazendo aquilo que no Nordeste se diz: "Tirar pão da boca de cego".

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