São Paulo, domingo, 19 de fevereiro de 1995
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O tempo de serviço

Quando se fala no fim da aposentadoria por tempo de serviço, logo todas as centrais sindicais se levantam dizendo que estão querendo acabar com um dos poucos benefícios oferecidos justamente aos mais pobres, que são os que começam a trabalhar mais cedo.
Mas as coisas podem não ser exatamente assim. Em que pese a quase inexistência de números oficiais a respeito do perfil dos aposentados, o ministro da Previdência, Reinhold Stephanes, está convicto de que 90% dos trabalhadores de baixa renda se aposentam depois dos 60 anos.
Para o ministro —e a sua argumentação tem lógica—, são as categorias mais bem organizadas e remuneradas as que conseguem se aposentar pelo tempo de serviço, de modo que esse tipo de jubilamento acaba sendo um benefício concedido aos mais favorecidos em detrimento dos mais pobres.
Um dos raros números oficiais existentes revela, por exemplo, que a idade média do trabalhador rural aposentado é de 62 anos. Cabe lembrar que o trabalhador rural é possivelmente um dos mais sofridos deste país e o que mais cedo começa a trabalhar.
Esse aparente paradoxo encontra explicações plausíveis. Segundo o IBGE, quase a metade da população economicamente ativa do país (49%) está na economia informal, ou seja, trabalha sem registro em carteira, não tendo, na hora de aposentar-se, como demonstrar que de fato trabalhou.
O ministro calcula que cada trabalhador brasileiro de baixa renda permaneça, em média, cinco anos no mercado informal. São cinco anos perdidos para efeitos de aposentadoria. Assim, um homem que tenha começado a trabalhar aos 20 anos só poderia se aposentar por tempo de serviço aos 60 (35 anos de contribuição mais 5 perdidos no mercado informal).
Já categorias mais organizadas, sobretudo no serviço público, além de sempre trabalharem dentro do mercado, ainda utilizam uma série de artifícios para aposentar-se antes, como a contagem da licença-prêmio como tempo de serviço em dobro ou a incorporação do período de estudo como trabalho.
Como se vê, a reforma da Previdência é do interesse do trabalhador mais pobre. Não é justo que ele continue a financiar as aposentadorias precoces dos que ganham muito mais do que ele.

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