São Paulo, segunda-feira, 20 de fevereiro de 1995
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Ficção barata eleva cineasta ao olimpo do pop

ESPECIAL PARA A FOLHA, DE LOS ANGELES

"Tempo de Violência" começa e termina no mesmo lugar: em uma lanchonete dessas típicas do subúrbio e das estradas de Los Angeles, onde se consome café aguado e comida gordurenta em grande quantidade e tempo recorde.
Na primeira cena, um casal de assaltantes de segunda —vivido por Amanda Plummer e Tim Roth— troca juras de amor, enquanto discute se deve ou não parar de assaltar lojas de bebidas. Na última, as portas do inferno se abriram sobre a lanchonete, e balas voam para todos os lados.
Entre um momento e outro, como uma salsicha entre as metades de um pãozinho de cachorro-quente, Tarantino desfia a saga de um grupo peculiar de personagens, e como seus caminhos têm ou não a ver com os amantes (e as balas) da lanchonete.
Gente como os samurais urbanos Jules (Samuel L. Jackson) e Vincent (John Travolta), o patrão deles, o gângster Marcellus (Ving Rhames), e a mulher de Marcellus, Mia (Uma Thurman). Ou ainda Butch (Bruce Willis), o boxeador comprado por Marcellus, e sua namorada francesa (Maria de Medeiros). E The Wolf (Harvey Keitel), o pistoleiro de elite da gangue de Marcellus.
A ligá-los e desligá-los há uma maleta misteriosa, um concurso de twist, uma overdose de heroína, um morticínio acidental e um completamente intencional, uma ressurreição, um par de caipiras sadomasoquistas e muitas discussões sobre o erotismo das massagens no pé e as diferenças entre um hambúrguer com fritas na Europa e nos Estados Unidos.
Tudo costurado por uma brilhante trilha sonora e uma longa passagem do livro de Ezequiel, no Antigo Testamento, que Jules gosta de recitar quando está seriamente motivado a matar alguém —uma idéia que Tarantino roubou descarada e assumidamente de um filme japonês.
"Tempo de Violência" apresenta três narrativas intercaladas, inspiradas, como indica o nome original ("Pulp Fiction"), na ficção policial popularesca celebrizada nos anos 30 e 40.
O embrião do filme nasceu em 1986. Após várias tentativas frustradas de vender o roteiro de um longa, Tarantino escreveu um curta e pediu outro a seu amigo Roger Avary. O cineasta decidiu, então, fazer uma terceira história, sobre um assalto frustrado a uma joalheria, que acabou resultando em "Cães de Aluguel".
Depois do sucesso de sua estréia, Tarantino voltou à idéia original das três histórias, reaproveitando as duas que sobraram e criando uma nova.
Laureado em Cannes, "Tempo de Violência" já chegou aos Estados Unidos —em setembro de 94— com fama de violento e cult.
Enquanto a mídia debatia se o filme era assistível ou se faria um mal irreparável à juventude americana, "Tempo de Violência" virou mania —o filme que todo mundo tem que ver mais de uma vez— e, em seis meses, rendeu quase US$ 80 milhões na bilheteria, ultrapassando as perspectivas mais otimistas da distribuidora, a Miramax. Isso sem falar na Europa, onde o filme bateu recordes de renda e catapultou Tarantino para o status de "megastar" pop.
Agora, é o antifavorito do Oscar, o representante do "under" no mundo do "mainstream" —uma posição que delicia Tarantino com sua riqueza de ironias.

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