São Paulo, terça-feira, 21 de fevereiro de 1995
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Fama chegou aos 70 anos para o cineasta

INÁCIO ARAUJO
DA REDAÇÃO

Para os brasileiros, Manoel de Oliveira é um mistério. Embora seus filmes sejam apresentados no Brasil com regularidade, em mostras, desde os anos 80, custamos a acreditar que um português seja elevado, às nossas costas, à condição de um dos grandes do cinema mundial.
Mas é o que acontece. Desde que filmou "Amor de Perdição" (1978), a crítica européia se deu conta de um talento invulgar.
O cineasta nascido no Porto tinha 70 anos na época. Começara no curta-metragem em 1929. Em 1942, fez "Aniki-Bobo", brilhante trabalho em que antecipa o neo-realismo.
A descoberta de "Amor de Perdição" propiciou a revisão de filmes anteriores, como "O Passado e o Presente" (71) e "Benilde ou a Virgem Mãe" (74).
Revitalizou também, tardiamente, a carreira deste cineasta bastante prejudicado pela era salazarista. Daí por diante, veio uma série de obras-primas, com estilo próprio e humor estranho.
O cinema de Oliveira não é propriamente comercial. Normalmente, ele trabalha com temas variados, que vão desde a história e a natureza do povo português (no magnífico "Non, ou a Vã Glória de Mandar", painel que mostra desde a derrota de d. Sebastião em Alcácer-Quibir, no século 16, até as guerras coloniais contemporâneas) até o olhar sarcástico sobre os poderosos de seu país (a ópera "Os Canibais"). Com a mesma desenvoltura, pode mergulhar em Camilo Castelo Branco ("Francisca", "O Dia do Desespero").
No Brasil, dois obstáculos têm impedido a boa difusão de sua obra: o uso de planos longos, num tempo em que a linguagem do cinema americano passa como um trator sobre os filmes destoantes, e a língua (mais a acústica precária das salas) que às vezes tornam quase incompreensíveis seus trabalhos.
Unanimidade em seu país, inspiração para mais de uma geração de cineastas, agora Oliveira acaba de filmar "O Convento", com Catherine Deneuve e John Malkovich nos papéis principais.
Motivo para um novo mal-entendido: neste filme, o trabalho com atores internacionais serviu para desencadear a oposição de alguns jovens cineastas portugueses ao tipo de produção (grande) em que se engajou.
Isso se deve em boa parte às dificuldades atuais do cinema português. O governo optou por incentivar os filmes "de mercado" em detrimento dos trabalhos "artísticos". O que para um desses cineastas, Pedro Costa, significa perder o prestígio internacional em troca de um mercado nacional mínimo. Para Costa, uma estratégia suicida, já que os portugueses, de todo modo, não costumam apreciar seus próprios filmes, comerciais ou não.

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