São Paulo, quarta-feira, 22 de fevereiro de 1995
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Otários ou espertos?

EMERSON KAPAZ

Os países do Primeiro Mundo estão repletos de otários. São empresários, profissionais liberais, trabalhadores e aposentados que pagam impostos. Graças à ingenuidade deles, o Estado garante educação básica e saúde para todos, equilíbrio das contas públicas que assegura estabilidade econômica por décadas, investimentos estratégicos em ciência e tecnologia, saneamento básico, preservação ambiental, enfim, uma qualidade de vida como a humanidade jamais desfrutou em toda sua existência.
Aqui, felizmente, vivemos no país dos espertos: "Pra que pagar imposto? Para entregar recursos a administradores públicos ineficientes, inescrupulosos, corruptos? Para chegar ao fim do ano e surpreender-se com o aumento de mais um tributo?" —escuta-se com frequência.
A verdade é que a sonegação tem seu preço: a triste deterioração do Brasil, a ineficiência do Estado, a inflação, o empobrecimento generalizado das pessoas. Ao mesmo tempo, o aumento do número dos impostos e das alíquotas também tem seu preço: a sonegação. Se bem empregados por governantes éticos e eficientes, os impostos têm um duplo mérito: distribuir renda e assegurar recursos para o Estado pagar suas despesas e ainda investir em escolas, hospitais, policiamento, habitação popular. Mas, como superar o desafio de convencer o brasileiro escaldado de que, desta vez, vale a pena pagar imposto?
A primeira tentativa será feita hoje, em São Paulo. O governador Mário Covas vai assumir o seguinte compromisso público: se de fevereiro a julho a arrecadação do ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) crescer 20% reais em relação à previsão orçamentária, a alíquota deste tributo cairá de 18% para 17% a partir de agosto.
É preciso sublinhar bem: não estamos mais em campanha, não se trata de promessa eleitoral. Estamos falando de ações concretas de um governo que se debate para não ser imobilizado por uma dívida herdada de R$ 48 bilhões. O raciocínio é simples: se todos pagarem o imposto, ele não precisa ser tão elevado. O Estado arrecada mais e os contribuintes podem passar a pagar um pouco menos.
Se der certo, e se novamente de agosto de 95 a janeiro de 96 a arrecadação crescer 10% reais em relação ao resultado do primeiro semestre, o ICMS cairá de 17% para 16% a partir de fevereiro de 96. Ganharão todos: a população, que poderá adquirir alimentos e produtos em geral mais baratos e, portanto, em maior quantidade; os empresários, que melhorarão seu faturamento e poderão investir mais em novas plantas fabris, produtividade e tecnologia; e o governo, que poderá pagar o custeio e ainda ter uma sobra para investir na indução do desenvolvimento de São Paulo.
E se não der certo? E se a meta dos primeiros seis meses não for atingida? Neste caso, vamos tentar de novo, repetindo a mesma meta do primeiro semestre para o segundo. Caso tenhamos êxito, o ICMS cairá de 18% para 17% em fevereiro de 96. Nova meta seria pactuada para o período fevereiro a julho de 96.
Para que a diminuição do imposto se torne realidade, todos poderão ajudar. Na linha de frente, estão as lideranças empresariais, de quem se espera um trabalho de catequização junto ao universo de 835 mil empresas sujeitas ao recolhimento de ICMS. Dos trabalhadores, da sociedade civil como um todo espera-se uma pressão permanente para o cumprimento da meta. E dos deputados estaduais, que em agosto e fevereiro votem as leis de redução do imposto, caso as metas sejam atingidas.
Ao mesmo tempo, estaremos todos assumindo uma responsabilidade muito maior do que pagar 1% a menos de imposto. É que além de paulistas, como cidadãos de nossos municípios e do Brasil. Estamos sujeitos a dezenas de impostos municipais e federais, que não dão sinal de diminuir.
Se conseguirmos implantar o compromisso com sucesso no Estado, estaremos dando um exemplo para ser seguido pela União e pelos municípios. São Paulo estará impulsionando pela primeira vez, uma reforma tributária digna deste nome, na direção daquilo que a sociedade exige: maior arrecadação através da diminuição da carga tributária com sua melhor distribuição e alargamento da base de arrecadação.
A possibilidade efetiva de alcançar esse objetivo está, a partir de hoje, nas mãos de cada um de nós. Otários ou espertos, você decide.

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