São Paulo, domingo, 26 de fevereiro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Trade-off

O noticiário vem registrando uma série de recuos do governo neste início de debate sobre a reforma constitucional. Da área tributária à Previdência, há sinais de que o Executivo estaria cedendo a pressões e apresentando propostas mais tímidas do que seria sua intenção original. Essa sensação inicial de desaponto, contudo, deve ser vista com muita cautela.
Qualquer tentativa de avaliação mais criteriosa da atuação do governo de Fernando Henrique Cardoso até agora exige de fato que se superem armadilhas como o simplismo e o voluntarismo. É óbvio, por exemplo, que o ideal seria que todas as reformas necessárias fossem feitas o mais rápido possível. Mas, em termos políticos e congressuais, isso é de um irrealismo cabal. Uma proposta ideal vetada pelo Parlamento é tão inútil quanto proposta nenhuma. Talvez pior.
Não se pode, porém, cair no outro extremo, igualmente inadequado, de justificar a timidez e, no limite, a passividade em nome do realismo político. É imperativo cobrar que as reformas avancem. O fulcro da questão é saber em que ritmo elas devem e podem caminhar.
Nesse sentido, é de se indagar se FHC não estaria sendo mais tímido do que o necessário, além de não fazer uso integral dos seus trunfos. É verdade que os partidos brasileiros são no geral amálgamas amorfos, sem coesão e identidade. Mais ainda, o Congresso é rasgado por grupos de interesse que se sobrepõem às legendas e que, irresponsáveis quanto ao sucesso do governo, não hesitam em colocar de lado as necessidades maiores do país. Nesse ambiente, a costura de uma emenda constitucional é tarefa sem dúvida delicadíssima.
Por outro lado, é também fato que FHC assumiu com um dos maiores apoios populares da história do país. Um capital que, se mobilizado para a causa das reformas, poderia ampliar sobremaneira o cacife presidencial face ao Legislativo.
Se souber usar bem esse recurso —o que não vem fazendo até agora— poderia, com consistência, insistir numa reforma mais rápida e audaciosa. E é bom não ter dúvidas quanto a isso. O país realmente precisa da reforma mais rápida e audaciosa que puder conseguir.

Texto Anterior: Participação nos lucros
Próximo Texto: Por dentro e por fora
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.