São Paulo, domingo, 12 de março de 1995
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"Semana negra" derruba credibilidade do governo

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Projetado em segredo dez dias antes do Carnaval, o Real 2 produziu um inesperado efeito colateral: em vez de aumentar, diminuiu a credibilidade do governo.
Sem oposição no Congresso desde a sua posse, em janeiro, o presidente Fernando Henrique Cardoso passa agora a não dispor de aliados confiáveis. Os partidos governistas se aproveitam da fragilidade do governo para impôr exigências ao Palácio do Planalto.
O governo vai desencadear nesta semana uma operação de guerra para tentar evitar o fracasso da reforma constitucional, seu principal projeto depois do Plano Real.
Estudos oficiais entregues a Fernando Henrique indicavam que, se o valor do dólar não fosse elevado, haveria um vigoroso déficit na balança comercial. O rombo variaria de 14 a 20 bilhões —um desastre que aumentaria o risco de repetir-se no Brasil o caos mexicano.
Submetido a Fernando Henrique no último domingo, em nova reunião secreta que entrou pela noite, quebrando a rotina do Palácio da Alvorada, o pacote do Real 2 recebeu sinal verde.
Otimista, o presidente disse a um auxiliar que a semana seria promissora, tanto na área econômica, como na política. Confiava em que o governo mexeria no câmbio e, sem sobressaltos, elevaria o saldo comercial, estimulando as exportações.
No Congresso, de volta do feriadão do Carnaval, os parlamentares seriam contaminados pelo êxito de mais uma fase do processo de administração da economia e, animados, deslanchariam o debate sobre a reforma da Constituição.
O presidente contava com uma tramitação rápida. Ele condiciona a manutenção da estabilidade econômica à aprovação das reformas. O terremoto do câmbio tingiu de cinza o cenário que Fernando Henrique enxergava com uma coloração rósea.
Ao final da tarde da última sexta-feira, o presidente reconhecia, sob reserva, que seu governo perdeu terreno. Mostrava-se chateado com a equipe do Banco Central, em especial com Pérsio Arida. Responsabilizava-o pelo terremoto do câmbio.
Passado o tremor econômico, o Palácio do Planalto enfrenta agora o cerco dos políticos. Dono da maior legenda do Congresso, o PMDB adotava na última semana um comportamento dúbio.
Em reunião na terça-feira, a bancada do PMDB na Câmara mostrou-se hesitante em relação às mudanças. Os peemedebistas não asseguravam nem mesmo a aprovação do primeiro lote de emendas enviado pelo governo, que mexe no Capítulo da Ordem Econômica. Supunha-se que esse tópico das reformas seria consensual.
Na quarta-feira, o líder peemedebista no Senado, Jáder Barbalho, comandou, diante das câmeras de televisão, o processo de aprovação da emenda que limita a taxa de juros reais a 12% ao ano. Uma providência execrada por Fernando Henrique e por seus ministros econômicos.
Simultaneamente, o presidente do PMDB, deputado Luiz Henrique (SC), discutia nos bastidores com o ministro das Comunicações, Sérgio Motta, a indicação de nomes para preencher diretorias nas subsidiárias da Telebrás nos Estados.
O governo fará a partir de amanhã um mapeamento de seus aliados. Quer saber, na ponta do lápis, com quantos votos pode contar e quanto cada um vai custar. A crise do câmbio, agora superada, desvalorizou a autoridade do presidente. Em consequência, aumentou o custo de sua sustentação no Congresso.

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