São Paulo, segunda-feira, 13 de março de 1995
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EUA anunciam apoio a ONGs

CLÓVIS ROSSI
DO ENVIADO ESPECIAL

O vice-presidente norte-americano, Al Gore, anunciou ontem uma mudança na política de seu país para a ajuda externa.
Agora, 40% dos recursos destinados aos países pobres serão canalizados não pelos governos, mas pelas ONGs (organizações não-governamentais).
Trata-se da mais concreta demonstração de que a Cúpula para o Desenvolvimento Social, ontem encerrada em Copenhague, serviu acima de tudo para consolidar o papel e a influência crescente das ONGs, em detrimento de governos e partidos.
Além das ONGs, os EUA privilegiarão os governos locais, em vez do governo central, e "fortalecerão pequenos negócios e empreendedores para empurrar o crescimento", disse Gore.
A iniciativa não foi a única menção às ONGs, na maratona de discursos que marcou o encerramento da conferência, também chamada de Cúpula do Homem.
"O desenvolvimento social não pode ser alcançado apenas pelos governos, mas requer a participação ativa da sociedade civil como um todo, incluindo as ONGs", disse, por exemplo, o premiê japonês Tomiichi Murayama.
Na véspera, o presidente francês, François Mitterrand, já havia considerado "muito encorajadora" a presença das ONGs, porque "não se pode criar felicidade para o povo sem o seu envolvimento".
Não são apenas palavras. Em 1992, últimos dados disponíveis, as ONGs já haviam sido responsáveis pela canalização de cerca de US$ 2,5 bi em recursos dos países ricos para os mais pobres.
Além disso, é crescente a interação entre elas e os governos, o que, aliás, é motivo de ácidas polêmicas internas.
O financiamento oficial para as organizações não-governamentais passou de 1,5% de seus orçamentos, em 1970, para 30% em 1992.
O presidente brasileiro, Fernando Henrique Cardoso, até chegou a ironizá-las, chamando-as de "organizações neogovernamentais", em vez de não-governamentais.
Em Copenhague, o governo dinamarquês contribuiu com US$ 4,5 milhões para que se pudesse realizar o Fórum-95, um evento paralelo à cúpula.
Foi outra demonstração de força das ONGs. Ontem, o balanço final indicava que 2.780 delas haviam enviado representantes e que cerca de 130 mil pessoas se animaram a pagar o ingresso de 30 coroas (cerca de US$ 5,30) para assistir eventos do Fórum-95 ou por mera curiosidade.
Há, entre as organizações, o que os mais sérios chamam de "pilantropia", neologismo que combina filatropia com pilantragem.
Mas parece evidente que, ironias, curiosidade e "pilantropia" à parte, ninguém gastaria 30 coroas (ou reais ou qualquer outra moeda) para participar de discussões de um partido político.
É esse, claramente, o espaço que as ONGs estão ocupando e que, de alguma forma, Gore sacramentou. (CR)

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