São Paulo, segunda-feira, 13 de março de 1995
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Estava à-toa na vida

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO — A semana que passou serviu para escancarar terrível injustiça. Uma dezena de bicheiros está presa aqui no Rio por explorar jogos de azar. Essa é, até agora, a única acusação formal contra eles. As suspeitas de envolvimento com o tráfico de drogas e outros crimes ainda não foram suficientemente provadas.
No entanto, continuam em liberdade outros exploradores de jogos de azar, vale dizer, aqueles que a imprensa e o governo costumam chamar de especuladores, entre eles, o próprio governo que também está vivendo de especulações e dos azares cambiais.
Há que se admitir alguma emoção nesse jogo. Na última quinta-feira, a parada que estava na mesa era de alguns bilhões de dólares. Funcionou a velha regra: quando há excesso de fichas no pano verde (ou quando um bicho de repente é cercado pelos sete lados e as apostas explodem), o dono da banca sobrecarregada tem o recurso (nada ético) de mudar a regra do jogo.
Foi o que aconteceu. A barbeiragem do Banco Central tornou-se mais lamentável por um detalhe: o BC continua operando como se a economia mundial fosse a mesma de 1944. Recusa-se a perceber que, enquanto o Brasil oferecer os juros com que procura sustentar a taxa do dólar, a tal "nuvem" de que fala o Delfim Netto não tem razões para sair do mercado.
A briga entre o BC e os especuladores provocou assanhamento, a deslumbrada euforia no arraial governista, nele se incluindo os escribas que consideram o nhenhenhém de FHC a pedra filosofal dos novos tempos. Parece que o ministro Pedro Malan saiu um pouco chamuscado —o que é pena. Pérsio Arida não mais devia enganar ninguém desde o Plano Cruzado. Cesteiro que faz um cesto faz cem. Acho gozada a sua cara de meirinho em início de carreira.
Quem pisou feio na bola foi o próprio FHC. A TV mostrou sua entrevista num jardim chileno, pouco antes de regressar ao Brasil. Ele falou com orgulho nas bandas que salvariam o real. O desmentido posterior foi um vexame. Pior: foi, como se viu, inútil.

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