São Paulo, terça-feira, 14 de março de 1995
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Governo sem partido

MARCELO BERABA

SÃO PAULO — O terremoto que sacudiu a economia na semana passada escondeu a crise política que começa a se formar em torno do governo.
FHC ainda não experimentou para valer sua base de sustentação política no Congresso, mas a pergunta que já se faz é se realmente dispõe dessa base.
É bom lembrar que a costura do acordo entre o PSDB e o PFL durante a campanha eleitoral e a posterior atração do PMDB foram consideradas provas da capacidade política do presidente e de seus estrategistas.
Os problemas do governo começam em casa. Na terça-feira a bancada do PSDB na Câmara ameaçou se rebelar por se sentir alijada. O partido já havia perdido os principais cargos na Mesa, a liderança do governo e as presidências e relatorias das comissões.
Na quinta, o presidente do partido, Pimenta da Veiga, renunciou. Considerou impossível presidir o partido com um secretário-geral que acumula um cargo de ministro. Saiu cobrando de FHC definições claras em relação ao que quer dos políticos e dos partidos.
A lógica da estratégia presidencial é óbvia: FHC sabe que não tem condições de governar o país apenas com o PSDB. Daí as concessões aos outros partidos.
Só que: 1) apesar de muitas, essas concessões ainda não foram suficientes e o governo vai ter de ceder mais; 2) essa política de diálogo preferencial com outros partidos e concessões vem enfraquecendo e desacreditando o PSDB, que praticamente deixou de ser um interlocutor no Congresso.
O problema do governo é definir que papel que cabe ao PSDB, se é que cabe algum. Collor foi eleito pelo PRN e ignorou o PRN. Arrivista, achava que poderia atropelar o establishment político com a força da opinião pública. Acabou atropelado. Mas sabia o que queria.
Não se pode dizer que o governo abandonou o PSDB. Mas está claro que não sabe o que fazer com ele. Como a principal característica dos políticos —frequentemente a única— é o instinto de sobrevivência, certamente o partido saberá o que fazer com o governo.

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