São Paulo, sexta-feira, 17 de março de 1995
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Denise Milan exporta sua arte pública para as ruas de Nova York

KATIA CANTON
ESPECIAL PARA A FOLHA

Arte, na maioria das vezes, no Brasil, define o conjunto de obras que recheia museus, galerias e valoriza paredes de colecionadores. Avessa a esta situação, Denise Milan, 40, é uma das artistas brasileiras que mais se volta para a questão da arte pública.
A partir deste mês ela realiza dois projetos no gênero, um em Nova York e outro em São Paulo. Amanhã, abre uma instalação —uma vitrine-sonora, que se comunica com o público— na galeria Art in General, no SoHo.
Em abril, ela inaugura um novo cenário para o programa "Metrópolis", da TV Cultura. Em entrevista à Folha, Milan explica a evolução de seu trabalho.

Folha - Como você chegou ao formato público da arte?
Denise Milan - Minha formação é interdisciplinar, o que me incutiu uma preocupação ritualística do espaço. Em Nova York, onde morei, escrevia poemas, que acabaram sendo musicados por Naná Vasconcelos. Lá seguia artistas como Spalding Gray e o grupo Mabou Mines. Estudei o Nô japonês, o kabuki, o bunraku.
Folha - Como surgiram os cristais, uma presença consistente em seu trabalho?
Milan - O cristal contém luz e uma forma perfeita. E é translúcido. Os mais perfeitos cristais do mundo estão no Brasil. Digo que eles traduzem a lucidez brasileira.
Na verdade, eu demorei dois anos para interferir nessas formas que pareciam tão prontas. A saída foi conjugar a essência natural do cristal com a questão urbana. Assim eu cheguei a fazer instalações ambientais como "Garden of Light", que foi para a galeria São Paulo e depois para o PS1 em Nova York, em 1988; a "Cristaluz", em 1990; a "Gruta de Maquiné", feita durante a 21ª Bienal de São Paulo, em 1991; a "Druza", que reproduz um tetraedro, realizada no Anhangabaú, em 1992; e "O Ventre da Vida", instalada no metrô, estação Clínicas, em 1993.
Folha - Você cria sozinha?
Milan - Não. Diferentemente da arte individual, a arte pública é um projeto de colaboração. Trabalho em parceria com Ary Perez, engenheiro, meu marido. Nessas obras de grande escala o processo criativo é totalmente afinado com o processo construtivo. O uso dos materiais está ligado a questões de peso, densidade, luz. Nós dois orquestramos as possibilidades, pesquisamos a realização.
Folha - E o projeto do cenário para o "Metrópolis"?
Milan - Ali eu combinei uma série de cristais incrustados em prédios, feitos de sucata da própria emissora. A idéia foi trabalhar metaforicamente com a dualidade entre cidade e natureza.
Folha - E a instalação em Nova York? Como se chama?
Milan - "Cadumbra". Esse nome é uma espécie de mantra, que ficará ecoando, na minha voz, de dentro da instalação. É para ter o tom de um "canto de sereia".
A instalação tem o formato de uma ilha, que representa a essência da vida. "Cadumbra" é o nome do poema que eu escrevi, que evoca experiências subjetivas ligadas à visão do paraíso e a descoberta do Brasil.
A ilha ficará enterrada no asfalto, à frente da galeria. É como se fosse uma intromissão mágica, uma interferência entre o espaço privado, da galeria, e o público, do transeunte.

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