São Paulo, sábado, 18 de março de 1995
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O prisioneiro das forças auxiliares

JOSÉ GENOINO

É preciso constatar que a origem dos problemas que o presidente Fernando Henrique Cardoso enfrenta na relação com o Congresso está nos próprios sistemas de governo e eleitoral partidário.
Existem estudos sólidos que provam as chances menores do sistema presidencialista conseguir maioria parlamentar em relação ao sistema parlamentarista. O nosso sistema partidário e eleitoral, com um pluripartidarismo desregrado e com uma representação distorcida na Câmara, também é um fator de pulverização da representação parlamentar.
A lógica dispersiva e a ineficácia política que esses sistemas produzem já foram suficientemente expostas pela prática política.
A situação de FHC é emblemática. O seu partido, o PSDB, é o terceiro numa composição de forças que não se sustenta sobre um programa de governo. Basta dizer que o maior partido do bloco governista, o PMDB, concorreu contra o governo nas eleições.
O PSDB, além de ser a terceira força, saiu do processo eleitoral sem um perfil político-programático e sem força de liderança. O presidente tem, assim, precárias forças próprias. Está condenado a exercer o seu mandato, até o fim, sustentado por um conjunto de forças heterogêneas, que não tem um compromisso de fidelidade maior com as proposições do governo. A força política angariada por FHC pela eleição no primeiro turno esvaiu-se sem que o governo fizesse grandes coisas.
Se não é o programa que dita a conduta política de um bloco governista, são outras coisas, como o interesse por cargos, espaço e poder. Todo esse jogo de interesses existe em qualquer realidade política. Mas ele precisa ser legitimado por objetivos políticos vinculados ao interesse público.
Quando os interesses particulares dos partidos e dos políticos começam a se constituir no centro das definições é porque se está ingressando numa situação perigosa, onde o interesse público tende a ser suplantado por interesses menores.
Outro problema de FHC são os vínculos tradicionais que movem a relação entre Legislativo e Executivo. O Congresso não se renovou quanto ao seu funcionamento, não criando condições de transparência com os demais poderes e com a sociedade.
A relação entre os dois poderes permanece na base do corporativismo, do clientelismo e da troca de cargos e favores. Quando parlamentares governistas reivindicam um articulador político, não se trata de alguém que coordene e encaminhe apoios às políticas governamentais. Querem um intermediador de cargos e favores. Para não perder força política o governo é obrigado a fazer concessões. Mas as concessões também são uma forma de enfraquecer politicamente o governo.
Pelo andar da carruagem pode-se concluir que o governo FHC expressa um discurso modernizante cada vez mais envolvido pelo manto das velhas práticas conservadoras.
O Brasil não conseguirá realizar uma modernização democrática e uma reforma social sem atingir privilégios estabelecidos. A atual coligação governante, pela sua própria natureza, mostra-se incapaz de realizar reformas profundas.
O impasse das reformas democráticas tende a persistir porque não se constituiu um campo de forças reformador, com capacidade e força governante.

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