São Paulo, segunda-feira, 20 de março de 1995
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Repensando o Estado

LUÍS NASSIF

Talvez seja exagero a contratação do economista americano David Osborne para assessor do governo brasileiro —como sugere o ministro da Administração Luiz Carlos Bresser Pereira.
Provavelmente porque o contribuinte americano reclamaria, e com razão —como observou o ex-ministro Mailson da Nóbrega. Foi o dinheiro do contribuinte americano que permitiu a Osborne montar o mais importante painel de experiências municipais da atualidade. E vem o professor Bresser, mediante sua contratação por um período de apenas 30 dias, querer receber a preços módicos o que o contribuinte americano financiou?
Seu livro —"Repensando o Estado"— merece estar na cabeceira de todo administrador público brasileiro. O apanhado de experiências municipais que faz é sumamente enriquecedor. E sua conceituação sobre os limites da ação empresarial do Estado ajudou a tirar o debate americano do nhenhenhém de neoliberalismo versus intervencionismo.
Osborne demonstra que o Estado precisa incorporar métodos da iniciativa privada, sistemas de controles e avaliação, flexibilização, capacidade de gerar receitas em atividades não-fiscais (como a exploração inteligente de alguns serviços não convencionais), sem jamais se esquecer que não é iniciativa privada.
Esta visa basicamente o lucro. O Estado basicamente o bem-estar dos cidadãos. Se for com lucro, melhor, porque aí podem-se reduzir os impostos.

Fórum nacional
O ministro Bresser Pereira deveria não só contratá-lo para seminários específicos, como montar programas visando consolidar e disseminar nacionalmente experiências administrativas municipais.
O caminho da municipalização é irreversível. Mas de que maneira tratar a questão do saneamento básico, das empresas de água e esgoto, da educação, da merenda escolar? Como obter receitas extra-fiscais, que permitam desonerar o bolso dos contribuintes?
É um absurdo que a excepcional criatividade da equipe de Jaime Lerner (ex-prefeito de Curitiba), que as virtudes do orçamento participativo de Porto Alegre, que as experiências (abandonadas pela nova gestão) da unidades escolares autônomas de Maringá, que os programas de qualidade e produtividade de Santo André, não sejam disseminadas.
São muito mais relevantes para construir um novo país e um novo Estado que essas pataquadas macroeconômicas que arruinaram o país na última década.

Falhas
O ministro Bresser Pereira é uma pessoa franca, corajosa e de bom senso. Tem duas falhas —falar muitas vezes sem explicar o que diz— e não dispor de critério literário apurado.

Municipalização
A merenda escolar federal em Uberaba jamais funcionou. Daí o ex-ministro da Educação Murilo Hingel decidiu municipalizar a merenda. Firmou um contrato inicial com alguns municípios, incluindo Uberaba. Valor do repasse: 15 centavos por refeição, que deixou o prefeito Luiz Guaritá Neto desanimado.
Hoje, 15 centavos por refeição permitem fornecer a cada estudante da cidade uma refeição com 420 calorias. A prefeitura prepara-se para administrar a abundância. Sua preocupação atual é adquirir freezeres para estocar carne.

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