São Paulo, quinta-feira, 23 de março de 1995
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Por que reitores dizem não

MARIA AMELIA SABBAG ZAINKO

Em seu artigo "Quem tem medo do exame?" publicado na Folha de 28 de fevereiro, o jornalista Gilberto Dimenstein chama a atenção para a resistência dos reitores a uma proposta do Ministério da Educação, agora transformada em medida provisória e que viria em benefício da melhoria da qualidade do profissional formado pelas universidades brasileiras.
Primeiro gostaria de enfatizar que o excelentíssimo sr. Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, em audiência com os reitores das universidades brasileiras destacou dois requisitos fundamentais para a melhoria do desempenho do sistema universitário brasileiro: autonomia e avaliação.
Tais temas veiculados pela imprensa têm merecido por parte dos dirigentes da IFES (Instituições Federais de Ensino Superior) a maior consideração, principalmente porque há consenso de que a avaliação é uma salutar maneira de prestar contas à sociedade que instituiu e que mantém as universidades públicas.
De tal sorte que em 1993 foi aprovado o Modelo de Avaliação das Universidades Brasileiras cuja base metodológica compreende a auto-avaliação, a avaliação interna e a avaliação externa.
A avaliação é compreendida como processo sistemático de diagnóstico de situações problemáticas e de indicação de alternativas para a sua correção, configurando-se como poderoso instrumental dialético de identificação de novos rumos para a prática universitária.
Somente como processo cíclico de ver, julgar e agir, a avaliação se converte em estratégia eficaz para subsidiar a formulação de políticas educacionais sejam elas de 1º, 2º ou 3º graus.
Ora, o que se tem, novamente, é a repetição de uma proposta que, sob a aparência de um benefício, colide com os requisitos de modernização do sistema universitário estabelecidos pelo próprio governo federal.
Senão vejamos:
A autonomia didático-científica das universidades que lhes permite estabelecer procedimentos de avaliação e aprovação de alunos colide com uma proposta de exame "de habilitação profissional" que delegue a agentes externos à universidade a efetiva aprovação dos seus alunos.
Mais ainda, tal proposta repousa em pelo menos duas premissas falaciosas:
—a primeira considera que a capacidade para o exercício profissional é passível de aferição por meio de um único exame, ao final e fora do processo de formação, onde o domínio de uma pequena parte de conhecimento teórico (o que é possível apreender em um exame), é critério suficiente de estabelecimento da competência e da qualidade do ensino ministrado.
—a segunda premissa remete para o interior da universidade a definição dos requisitos para seleção e ingresso no emprego, o que a boa teoria tem demonstrado ser função do mercado de trabalho.
Várias pesquisas têm demonstrado que a certificação escolar prévia é um, e nem sempre o mais importante, requisito de ingresso no mercado de trabalho, até porque esses requisitos são diferenciados de empresa para empresa e não necessariamente são relativos à competência e ao poder de exercício da crítica.
Fica desta forma evidenciada a absoluta falta de sustentação da proposta de exame "de habilitação profissional" exteriormente ao processo de formação, não só por ser medida inócua, mas, fundamentalmente, porque não será este equívoco de avaliação "capaz de jogar luz na fragilidade do ensino".

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