São Paulo, quinta-feira, 23 de março de 1995
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Erro de estratégia

O governo sofreu ontem uma importante derrota com a decisão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara de desmembrar a emenda constitucional do governo sobre a reforma na Previdência.
É evidente que o Congresso existe para discutir propostas e só então aprová-las ou não. O chamado fatiamento da emenda da Previdência era uma medida à qual o governo se opunha com firmeza. Não foi capaz, porém, de mobilizar sua bancada para rejeitá-la.
Os números da votação revelam mesmo que a suposta bancada governista tem muito de ficção. A CCJ tem 51 membros dos quais apenas 11 podem ser considerados parlamentares de oposição (PT, PDT, PSB e PC do B). Todos os demais, em tese, ou pertencem a partidos ligados ao governo ou se declaram sempre favoráveis às reformas.
Mesmo assim, toda a bancada do PP votou pelo fatiamento. Do mesmo modo procederam três congressistas do PMDB, todos da Paraíba. Note-se que o FHC sancionou a famigerada anistia ao senador Humberto Lucena (PMDB-PB) e tem um ministro do PMDB da Paraíba (Cícero Lucena, Políticas Regionais).
A votação, além de ter mostrado a precariedade da base governista, coloca em risco a aprovação de medidas que, segundo o Planalto, são fundamentais para o sucesso da estabilização da economia.
Fatiada, a emenda da Previdência corre o risco de ser apenas parcialmente aprovada. Os parlamentares poderão, por exemplo, considerar inconstitucional o fim da aposentadoria por tempo de serviço, mantendo contudo outras propostas. O resultado poderá ser uma espécie de Frankenstein, uma deformação da idéia original.
O preço político a ser pago pela aprovação também deve aumentar. Um exemplo, o PP não faz segredo de que está empenhado numa cruzada por empregos públicos. Se o governo quiser contar com os votos da bancada terá de ceder.
Em suma, a votação de ontem indica que a estratégia até aqui adotada pelo Planalto para construir uma base de apoio no Congresso está se revelando um fracasso. Se o presidente quer de fato aprovar reformas constitucionais (o que exige quórum de 3/5 em duas votações nas duas Casas), terá de repensar profundamente a sua ação.

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