São Paulo, quinta-feira, 23 de março de 1995
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Armadilha perversa

As recentes turbulências no mercado cambial deixaram como sequela uma excepcional elevação dos juros. De um patamar de cerca de 45% ao ano, no início de março, as taxas efetivas do overnight estão agora por volta de 65% ao ano.
O custo desses juros sobre a dívida pública e seus efeitos sobre toda a economia são preocupantes. Tão preocupantes, aliás, que o presidente do Banco Central, Pérsio Arida, afirmou no seu recente depoimento ao Senado que as taxas vão cair. Empurrou essa queda porém para um futuro incerto, depois que o atual surto especulativo passar.
À medida que os títulos do Tesouro e do Banco Central são renovados —o que é frequente—, o custo de rolar os cerca de R$ 62 bilhões da dívida federal pode ascender a quantias capazes de estourar qualquer Orçamento. Já no ano passado, com juros inferiores aos de hoje, o serviço da dívida consumiu R$ 5,1 bilhões, muito mais do que os R$ 2,3 bilhões gastos em 93.
Da mesma maneira, o ônus para empresas, Estados, municípios e toda sorte de mutuários é imenso. As vendas são encarecidas e o serviço das dívidas multiplica-se.
As taxas de 45% ao ano pagas até o início do mês, mesmo descontada a inflação, já eram muito altas em comparação com padrões internacionais. O patamar atual é absolutamente excepcional. É impossível visualizar uma economia estável com juros de mais de 4% ao mês.
Pode-se supor —como sugeriu o presidente do BC— que o atual nível das taxas financeiras visa apenas a contrapor-se a um momento de especial incerteza e que não se prolongará por muito tempo.
Se os ânimos se acalmarem, há de fato espaço para alguma redução dos juros. Mas sua utilização para conter a alta do dólar e a fuga de capitais limita a possibilidade de baixá-los significativamente.
Assim, estancar a subida do dólar com juros altos resolve provisoriamente um problema criando outro. Incapaz de acalmar o mercado por si mesma, a mudança cambial gera uma armadilha para o governo.
Se o dólar parece temporariamente sob controle, a elevação dos juros agora ameaça seriamente o equilíbrio da economia e, em particular, das contas públicas. E traz mais um desafio à estabilização.

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