São Paulo, domingo, 26 de março de 1995
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'Transgressão é regra no Brasil'

FERNANDO ROSSETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

Educar uma criança no Brasil traz um problema muito particular: a cultura do país é "macunaímica", afirma o psicanalista infantil Bernardo Tanis, 38, referindo-se ao "herói sem caráter" criado por Mário de Andrade (1893-1945).
"A ética está muito corrompida. A transgressão aqui é regra. Tem pai que, quando o filho conta que furou uma fila, por exemplo, responde: Legal, você não é um boboca".
Quando a escola vai discutir com essa criança o sentido da transgressão em relação ao grupo, "há uma incompatibilidade com os ideais da família".
"Como é que a criança vai poder lidar com isso?", pergunta Tanis. "Gera um problema sério. É o que eu mais vejo no consultório."
Para ele, a mente é comparável a um líquido. "Se você pega o líquido e põe em um espaço sem limites, ele escorre."
Com a mente ocorre a mesma coisa: "Se você tem uma série de impulsos, desejos e não tem um espaço que os contenha, eles assumem uma forma caótica."
Segundo Tanis, a família, inicialmente, e a escola têm essa função de "conter" os impulsos, de "oferecer alguns espaços para que os desejos, as angústias, as sensações da criança possam encontrar uma estruturação adequada".
"Mas temos que tomar cuidado para não cair no extremo oposto e dizer que os desejos, as pulsões, as fantasias têm que ser necessariamente contidas."
Pôr limites não é ficar falando "não" a qualquer momento: "Isso é castração."
Para ele, os limites "saudáveis" permitem, pela contenção, a organização da criatividade, permitem que o sujeito possa dispor de seus recursos, movimentam o indivíduo a crescer.
Tanis denomina esses limites de "contrato social": "Nós dois estamos conversando porque fizemos um contrato, marcamos hora. Se você chegasse atrasado, provavelmente eu não poderia conversar."

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