São Paulo, domingo, 2 de abril de 1995
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Guerra de guaranás revela nova estrela da publicidade

SÉRGIO DÁVILA
DA REVISTA DA FOLHA

Guerra de guaranás revela nova estrela da publicidade
A mais recente integrante do time das estrelas da publicidade brasileira gravou o jingle "Nescau tem gosto de festa" aos 12 anos. É parecida com a primeira-dama Ruth Cardoso. E mistura elementos de "teatro, psicologia e espiritualidade" na hora de criar.
Nesta segunda, a paulistana Margot Soliani, 41, apresenta à imprensa de São Paulo sua campanha para o novo Guaraná Brahma. São nove filmes de TV já considerados um marco por quem assistiu.
Dona da agência Bridge, que faturou US$ 12 milhões em 1994, Margot declara-se uma outsider no meio publicitário. "Não me visto de roxo e amarelo e não sapateio sobre a mesa para sair em coluna social", cutuca ela.
"Como estou sendo descoberta tarde, deu tempo de fazer 15 anos de análise e ter o meu ego sob controle", completa. A reação a esta intrusa no ciumento meio publicitário é variada.
Elogios rasgados. "Margot e seu grupo de trabalho são muito competentes. Estão mostrando que vieram para ficar", diz Eduardo Fischer, da Fischer, Justus.
Elogios calculados. "Vi seus filmes anteriores, do refrigerante Sukita, e eram bons. Acho que ainda vamos ser amigos", diz Washington Olivetto, da W/Brasil.
Distanciamento justificado. "Seria mais simpático se eu não me pronunciasse a respeito", diz Nizan Guimarães, da DM9, que tem a conta do concorrente (e líder) Guaraná Antarctica.
Se ela ainda não é unanimidade entre seus pares, está fazendo os executivos da Brahma e de seu controlador, o Grupo Garantia, sapatearem de felicidade.
Desde que os novos comerciais e Margot estrearam em Belo Horizonte, cidade escolhida para teste há seis meses, a participação do Guaraná Brahma no mercado local pulou de 2,9% para 12%.
A lua-de-mel entre esta celebridade tardia e a Brahma começou em 1992. A fábrica de bebidas abriu concorrência a doze agências para que fizessem o lançamento do refrigerante reformulado.
Na mesma época, Margot, que trabalhava na criação da agência CBBA, encontrava-se isolada num mosteiro, no interior de São Paulo. Aproveitava as férias para fazer meditação transcendental.
"A meditação é tão louca que em determinada hora você tem impulsos que ativam seu cerébro inteiro e melhoram sua consciência cósmica", explica. "O resultado é que você sai quicando pelo chão."
A CBBA interrompeu o aprendizado para que ela assumisse a criação da agência. O objetivo: apresentar proposta à Brahma.
Dias depois, Magin Rodrigues, o polêmico diretor de marketing da Brahma, declarou: nenhuma agência conseguira a nota 10. A concorrência estava cancelada.
Enquanto o mercado se desdobrava de novo atrás da cobiçada conta de US$ 10 milhões, Rodrigues chamou Margot nos bastidores. Tinha gostado de sua apresentação, mas queria que saísse do emprego e abrisse uma agência.
Nascia a Bridge. Uma diretora de criação que prefere não se identificar define a agência: "a DM9 dos bons tempos, quando ficava na Bahia e Nizan era estagiário".
"O fato de uma agência pequena ter uma conta tão grande gera uma ciumera", diz Margot. "Os generais dez-leões, vinte-leões, não aceitam" (fazendo referência ao prêmio do Festival de Cannes).
Batizada Margarida, esta filha de descendentes de italianos nasceu no Ipiranga ("ao lado do Museu"). Usa roupas largas e cabelos pretos curtos. Ao falar, fuma pouco, rói as unhas, olha nos olhos e bate na mesa seguidas vezes.
É de áries, motivo pelo qual encontra-se este fim-de-semana (seu aniversário) na Cidade do México. "Meu astrólogo, um duendezinho, disse que se eu passasse o dia 31 de março aqui em São Paulo seria muito mandona, muito general", diz ela.
Rica? "Tenho um Golf comprado em leasing e uma linha telefônica", diz. O dinheiro que ganha (ela não revela quanto), Margot gasta "em vinhos, CDs".
Mora num apartamento alugado em Higienópolis, "vizinha de FHC, mais politicamente correto impossível". Sozinha ("nunca casei, não tenho filhos, não quero filhos, não estou namorando").
Vai a cinema, teatro, restaurantes e litoral norte, "como todo paulistano". E lê. Atualmente, doze livros. "A autobiografia de Jung, a história de Teresa Dávila, 'A Sexualidade Sagrada', outro de uma auxiliar do Jung..."
Na fala, percebe-se a paixão da publicitária pela psicanálise: ela utiliza muito o verbo "elaborar", o substantivo "resgate", a expressão "essa coisa de" -como em "essa coisa de ser moderna".
Não é vaidosa. Usa anel triplo de Cartier na mão direita e um único brinco de argola na orelha direita ("odeio harmonia, essa coisa de dois brincos").
Margot não tem curso superior. Cursou mas não concluiu jornalismo, cinema e publicidade. Fez teatro. Em 1984, estava na montagem da peça "Clara Crocodilo", de Arrigo Barnabé. Nua.
Na publicidade, começou há 19 anos, como redatora de uma pequena agência, a Delta. Seu primeiro anúncio vendia lona de freio para caminhoneiros. ". Era rimado, em forma de poesia repentista".
Desde então, passou a maior parte de sua vida nos departamentos de promoção e merchandising das grandes agências. "É o primo pobre da criação, o que não dá visibilidade nem medalhas", diz ela.
Seu primeiro trabalho na Bridge, comerciais do refrigerante Sukita, em 1993, rendeu seis prêmios. Entre eles o do Festival de Nova York. Mas ela não quer ficar muito tempo mais "nesta área".
"O quê? Ficar vendendo sabão em pó o resto da vida?" O cinema seria seu interesse imediato. "Só existe uma profissão mais estressante que a de publicitário", diz. "A de motorista de ambulância."
Ela própria se rotula -e seus amigos concordam- de outsider, uma marginal no meio publicitário. "Não é preciso ser estrela nem filho da puta para dar certo".

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