São Paulo, domingo, 2 de abril de 1995
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Humorista recolhe lixo pelas ruas

ARMANDO ANTENORE
DA REPORTAGEM LOCAL

Popularidade, reconhecimento da crítica, nada parece arrancar Golias do estranho mundo em que vive. "Sou um sujeito esquisito", define-se.
Sempre que sai às ruas, carrega um saco plástico. "Cato o lixo que vou encontrando." Não qualquer lixo. Prioriza garrafas e latinhas. "Também vistorio bueiros. Odeio vê-los sujos."
Em contrapartida, não suporta carro limpo. "A pintura brilhando me incomoda. Adoro aquela cera que lambuza a lataria quando o carro sai da fábrica. Nunca deixo tirá-la. Aliás, nunca lavo o carro. Gosto que acumule poeira, que fique bem fosco."
Sapatos, só usa os pretos, de bico fino. Enche a sola de preguinhos. "É para ouvir o som dos meus pés pisando o chão -toc, toc, toc. Sapato precisa fazer barulho."
E camisa precisa ser bem larga, tamanho GG. "Já cueca, quanto mais apertada, melhor. Dizem que machuca, que pode atrofiar o pingolim. Sei lá. Por via das dúvidas, tem dias que dou um descanso para o coitado e não uso nada embaixo das calças."
Em casa, dispensa cortinas, box no banheiro e quadros. "Outro negócio que me tira o sono são canos. Detesto que se escondam nas paredes. Gostaria que fossem à mostra. Escondidos, me dão a impressão de que estão conspirando, inventando problemas para me prejudicar."
Também desconfia de fios que não aparecem. Irrita-se, por outro lado, com os que ficam expostos. "Ainda não descobri como resolver o dilema dos fios na minha cabeça", lamenta.
Enquanto fala, se mantém à esquerda do interlocutor. Quando há dois interlocutores, fica no meio. Se existem três ou mais interlocutores, pelo menos um tem que se colocar à esquerda de Golias.
O comediante pontua conversas com um tique longo e insistente: revira os olhos, entorta a boca, torce o nariz, balança a cabeça, tudo ao mesmo tempo. "Uma vez, procurei um psiquiatra para tratar do cacoete. Não deu certo. O doutor tinha mais cacoetes que eu."
Os colegas dizem que Golias é assim há muito tempo. "Na década de 60, mandou fazer um par de sapatos em São Paulo", lembra o humorista Jô Soares, 57. "Quando foi buscá-los, cismou que estavam muito altos. Pediu para o sapateiro tirar meio milímetro do salto. Depois, achou que ficaram baixos demais. Retornou à loja e perguntou: 'Dá para botar aquele meio milímetro de volta?' O sapateiro botou. Golias achou melhor tirá-lo de novo. Repetiu a ladainha umas cinco vezes até que o sapateiro se queimou: 'Seu Golias, ou o senhor pára ou eu arranco este salto e pronto'."
O supervisor de "A Praça É Nossa', Carlos Alberto de Nóbrega, 59, conta que não deixa cinzeiros perto do comediante. "Ele tem compulsão em limpá-los."
A atriz Consuelo Leandro recorda outra particularidade de Golias. "No começo de carreira, era muito pão-duro. Usava calça sem bolso só para não pagar cafezinho."

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