São Paulo, quarta-feira, 5 de abril de 1995
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A escola e o ventre materno

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - O casal de médicos mineiros Eva Maria Attademo Campos e Rubens Metello de Campos encaminha estudo que o Ministério da Educação deveria requisitar pela implicações que tende a ter no programa "Acorda, Brasil -É hora da Escola".
O casal faz uma pergunta no mínimo instigante: por que metade da reprovação/evasão se concentra no primeiro ano do ciclo básico? Se o problema fosse só de fundo pedagógico, a repetência deveria se dar igualmente nos demais anos, dado que os professores são os mesmos, o material escolar também, as instalações idem etc.
A resposta mais provável, indica o estudo, está no fato de que a reprovação inicial se deve à incapacidade congênita de um grande número de alunos de processar qualquer tipo de informação, por ser "deficitário pela fome sofrida desde o ventre materno, com graves sequelas cognitivas e afetivas".
O estudo pede que "não se despriorizem a recuperação da escola e o resgate do magistério, mas que também se focalizem as condições neurodesenvolvimentais do alunado".
A idéia de deficiências geradas pela fome não é nova, obviamente. Nova parece ser a abordagem proposta pelos médicos mineiros, que não conheço pessoalmente.
Sugerem um enfoque multidisciplinar, "envolvendo principalmente a pediatria, a ginecologia, a obstetrícia, as neurociências, especificando a psicofisiologia, a neuropsiquiatria infantil e a psicometria".
É óbvio que tal caminho é muito mais complicado e custoso. Mas se a prioridade que o governo federal quer dar à educação se limitar ao enfoque pedagógico e/ou ao uso de instrumentos modernos como TV, computadores, satélites etc., o risco que se corre é desperdiçar dinheiro.
Afinal, se parte do alunado, por deficiência que vem do ventre materno, não consegue absorver sequer o elementar, mais dificuldades terá com meios tecnológicos mais modernos.
Parece evidente que o Ministério da Saúde tem um papel tão relevante quanto o da Educação nesse projeto.

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