São Paulo, segunda-feira, 17 de abril de 1995
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Brasil-EUA: um diálogo necessário

PAULO TARSO FLECHA DE LIMA

O presidente Fernando Henrique Cardoso chega hoje em visita de Estado aos Estados Unidos da América. O objetivo que o traz a este país é claro: dar início a uma nova fase do diálogo bilateral. Uma fase que, à luz das múltiplas convergências estruturais que nos unem, seja marcada pela consolidação de um patamar mais elevado de entendimento político e pela percepção partilhada de que a cooperação bilateral deve ser vista como uma aposta estratégica, de interesse para os dois países.
As relações Brasil-Estados Unidos atravessam hoje período dos mais favoráveis de sua longa história. A evolução do cenário internacional e a própria evolução interna de cada uma das sociedades se encarregaram de deixar para trás algumas das divergências que nos afastavam. O fim da Guerra Fria consagrou como parâmetros de qualquer projeto de ordem internacional os mesmos valores que inspiraram a sociedade brasileira em seu anseio de mudança: a defesa da democracia; o livre mercado como caminho para o desenvolvimento; a proteção aos direitos humanos e ao meio ambiente. São esses valores fundamentais os pilares da nova relação com os Estados Unidos.
Essa base de valores partilhados tem expressão clara no domínio das relações econômicas. À medida que o Brasil aprofunda a revisão de seu modelo de desenvolvimento e transita para um estágio superior de sua industrialização, o mercado brasileiro desponta como uma das grandes promessas dos anos 90. Em caráter mais geral, nossa maior inserção no comércio internacional -como exportadores e importadores- reforça nossa defesa histórica do multilateralismo e faz do livre comércio um artigo de fé.
Os últimos 12 meses já oferecem exemplo concreto do que pode ser o futuro das relações econômicas entre Brasil e EUA e apresentam progressos substanciais em uma série de áreas relevantes. A evolução dos termos do debate sobre os mecanismos de proteção à propriedade intelectual é um caso claro. No momento em que o Brasil faz da cooperação internacional uma prioridade, o respeito aos direitos de propriedade intelectual se traduz materialmente em mais investimentos no país, em nosso acesso a um amplo universo de novas tecnologias e na própria proteção dos esforços da comunidade científica brasileira.
Também como exemplos concretos, mencionaria aqui o incremento dos fluxos de investimento direto dos EUA no Brasil e os entendimentos na Cúpula das Américas no que se refere ao livre comércio hemisférico.
Uma lição devemos extrair da Cúpula das Américas: qualquer desenho que se conceba para o futuro do mapa político hemisférico tem o Brasil como referência incontornável e como único parceiro capaz de, a partir do Sul e com visão própria do que deva ser o cenário internacional, equilibrar o peso dos EUA.
No âmbito das relações políticas, a fluidez de diálogo alcançada no último ano é testemunha eloquente de convergência de interesses e a reafirmação de nossos compromissos em temas como o da não-proliferação aproxima as duas posições.
Finalmente, no quadro mais amplo dos valores essenciais, e aqui o discurso de posse do presidente Fernando Henrique é peça axiomática, o compromisso do Brasil com a defesa dos valores éticos, com a justiça social e com os direitos humanos é base sólida sobre a qual construir uma política de maior aproximação.
O Brasil apresenta-se hoje ao cenário internacional com uma face renovada. Alcançamos a estabilidade econômica; oferecemos expressivas oportunidades comerciais e de investimento; somos, e isso é o mais importante, um país amadurecido politicamente, com a ordem democrática plenamente restabelecida e com relações sociais serenas e arejadas.
A construção de uma relação altaneira entre Brasil e EUA, devo dizer, não se dará em prejuízo de nossa clara identidade externa, nem atinge nossa reconhecida e imprescindível capacidade de atuação individual, em diferentes latitudes, na defesa de espaços externos próprios. A centralidade do Brasil, sua capacidade de atuação multilateral, sua influência regional e o universalismo de suas posições fazem do país um aliado necessário na busca de um novo arranjo político internacional que responda adequadamente aos desafios do após-Guerra Fria.
Ao buscar relançar, em bases mais amplas, as relações com os EUA, não cabe nenhuma timidez. Cabe apenas, sem que isso se possa confundir com arroubos ufanistas, o justo orgulho de uma sociedade que nos últimos anos pagou o elevado preço de sua coragem de mudar, e que hoje começa a ver recompensada sua determinação em construir um país com liberdade, desenvolvimento e justiça social.
É para falar desse país e desse povo que o elegeu para liderar as reformas de que ainda precisamos que o presidente Fernando Henrique Cardoso chega hoje em visita de Estado aos Estados Unidos da América.

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