São Paulo, segunda-feira, 17 de abril de 1995
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Rodin e Puccini

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - Vamos ter aqui no Rio, a partir desta semana, a exposição dedicada a Rodin. Em matéria recente que escrevi sobre ele, insisti em duas aproximações. Uma lógica, óbvia, aceita universalmente: Michelangelo. Outra fantástica, nascida de um delírio pessoal: com Puccini.
Esse mesmo, o autor de "Turandot", "Tosca", "La Bohéme", "Madame Butterfly" etc. Tecnicamente habilitado a escrever partituras sofisticadas, Puccini foi precursor de acordes e harmonias que fariam a glória de Ravel, Richard Strauss e de outros mestres da música moderna. Mas a facilidade com que criava melodias deu-lhe um fraco pelo popular, pela plebe. Rompeu até com o editor para fazer uma opereta, "La Rondine", que os teatros sérios não quiseram encenar.
Em Monte Carlo, entre fichas e roletas, ele lançaria aquele capricho que agora a CBS revive num CD gostoso, com Placido Domingo e Kiri Te Kanawa, mais a Sinfônica de Londres regida por Lorin Maazel.
Foi o próprio editor, Tito Riccordi, que estigmatizou seu mais famoso e rendoso editado com o rótulo: "Puccini é o Lehár dos ricos". Se vivesse um pouco mais, Puccini terminaria fazendo samba-enredo para a Imperatriz Leopoldinense.
Com Rodin sucedeu o oposto. Ele era plebe, copiava as piores coisas dos trabalhos de Carpeaux e Carrier-Beleuse. Fez uma viagem à Itália e descobriu Dante, Donatello e, principalmente, Michelangelo. Tornou-se, por direito de conquista, "o Michelangelo dos pobres".
Venera-se, honra-se, incensa-se Michelangelo nas alturas: ele se identifica com o assombroso Moisés que tirou de dentro daquele bloco de mármore. Mas é a Rodin que a gente ama, mesmo com seus apelos à vulgaridade, seu gosto muitas vezes duvidoso.
O regulamento das Escolas de Samba não permite, mas seria uma glória o desfile das estátuas de Rodin ao som do intermezzo de "Manon Lescaut" e do "Nessun Dorma".

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