São Paulo, quinta-feira, 20 de abril de 1995
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Nove filmes resumem história dos 'Cahiers'

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Nove filmes resumem história dos 'Cahiers'
Começa hoje no MIS ciclo dedicado aos 'Cahiers du Cinéma', a mais influente revista de cinema no mundo.
INÁCIO ARAÚJO
Crítico de Cinema
Em 1991, quando completou 40 anos, a revista "Cahiers du Cinéma" preparou uma mostra itinerante com 12 filmes franceses que representassem o gosto da publicação desde sua fundação até a época contemporânea.
De hoje a domingo (veja programação ao lado), o MIS (Museu da Imagem e do Som) exibe nove desses 12 filmes. É o que basta.
Nesse lote estão algumas raridades, como "Paris Nous Appartient", filme de estréia de Jacques Rivette (inédito no Brasil) e outros três filmes de estréia dos cineastas que começaram a carreira como críticos dos "Cahiers" e formaram o núcleo central da Nouvelle Vague: "Nas Garras do Vício", de Claude Chabrol, "Os Incompreendidos", de François Trufaut, e "Acossado", de Jean-Luc Godard.
Fecha a série dos "jovens turcos" (como eram chamados esses redatores da revista) o belíssimo "Minha Noite com Ela", o trabalho mais popular da primeira fase de Eric Rohmer. Vale assinalar que, nesse grupo, Godard, Trufault e Chabrol foram sucesso comercial logo de cara, o que não aconteceu com Rivette e Rohmer.
O ciclo traz ainda "Lola, a Flor Proibida", de Jacques Demy. Essa história lírica sobre uma bailarina de cabaré (Anouk Aimée) representa o grupo de cineastas que se agregaram à onda da Nouvelle Vague, embora não participassem dos "Cahiers" (Louis Malle, Alain Resnais, Agnès Varda e o próprio Demy, entre outros).
O ciclo completa-se com outros três filmes: o primeiro, "Passe Tom Bac D'Abord", de Maurice Pialat, representa a continuidade do pensamento da revista (o mesmo acontece com os filmes de André Téchiné, Philippe Garrel e Jacques Doillon, que não foram trazidos ao Brasil).
Os outros dois são "French Can Can", de Jean Renoir, e "Lola Montes", de Max Ophuls. Aqui, entramos no grupo dos cineastas franceses que ao mesmo tempo forjaram o gosto dos diretores da Nouvelle Vague (seja pelo estilo, seja por serem autores) e foram defendidos com ardor nas páginas dos "Cahiers", num momento em que a crítica francesa tendia a virar-lhes as costas.
O conjunto de nove filmes é mais do que representativo do pensamento da revista, sobretudo em seu grande momento (entre os anos 50 e 60). Traz a marca do pensamento realista de André Bazin, fundador dos "Cahiers" e mentor dos "jovens turcos".
Recentemente, Eric Rohmer definiria a atuação do grupo dizendo: "Nós não tínhamos idéias, tínhamos um gosto". Ou seja, se Bazin forneceu a base teórica de seu pensamento (a oposição à montagem, a defesa da continuidade espacial -através dos planos- , a idéia do cinema como arte realista, por exemplo), não chegou a impor um cineasta.
Os jovens críticos, ao contrário, marcaram época pela ousadia do gosto e pela maneira feroz como defendiam seus cineastas favoritos. A eles se deve o reconhecimento de valores até então ignorados pela crítica (Hitchcock, Howard Hawks etc.).
Contra boa parte do cinema francês da época, defenderam obras autorais, que exprimissem o ponto de vista de seus diretores. Instituíram a "política dos autores": defesa incondicional do cineasta como artista. Cimentaram, em grande parte, a modernidade do cinema, em dois frontes, o da escrita e o da realização. Reside aí a originalidade da revista: a de abolir a divisão entre realização e pensamento cinematográfico.

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