São Paulo, domingo, 23 de abril de 1995
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Comprador da Vale terá minas de ferro para explorar durante quatro séculos

FRANCISCO SANTOS
DA SUCURSAL DO RIO

Se o governo cumprir a sua promessa de privatizar a Companhia Vale do Rio Doce, a maior exportadora mundial de minério de ferro, ele transferirá para o novo dono jazidas suficientes para 423 anos de exploração, mantidas as quantidades extraídas atualmente.
O ministro do Planejamento, José Serra, disse à Folha que "não faz sentido" privatizar a Vale sem transferir junto o direito de lavra. A permissão do governo federal para exploração de minérios "é a razão de ser" de uma companhia mineradora, diz.
Se o direito de lavra for retirado, "ninguém vai querer comprar", prevê o ministro, também presidente do Conselho Nacional de Desestatização.
Mantido o ritmo, a mina pode ser explorada até o ano 2418, no século 25. Segundo o Banco Patrimônio, o totalidade das reservas de minério de ferro da Vale está avaliada em US$ 4 bilhões.
Já a avaliação completa de toda a empresa depende da ideologia do freguês. Segundo o antigo ministro nacionalista (já morto) Severo Gomes, ela valeria acima de US$ 20 bilhões. Já para a consultora americana Salomon Brothers, a Vale vale US$ 16 bilhões.
Além das jazidas de Carajás, o grupo possui reservas de 19,5 bilhões de toneladas no sudeste do país, suficientes para 354 anos de exploração no ritmo atual (55 milhões de toneladas por ano).
O presidente da estatal, Francisco José Schettino, considera a transferência de reservas tão extensas "o maior problema" que o governo terá que enfrentar no processo de privatização da Vale.
A legislação brasileira diz que as jazidas minerais pertencem à União -no artigo 176 da Constituição- mas não estipula prazo para concessões, ou seja, para a permissão de que empresas explorem a mineração.
Segundo o secretário executivo do Ibram (Instituto Brasileiro de Mineração), José Mendo Mizael de Souza, o Brasil segue a prática internacional de manter a concessão até o fim da jazida.
Para Carlos Oití Berbert, presidente da estatal CPRM (Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais), já que o minério de ferro não é considerado "estratégico" -conceito polêmico, que vem sendo revisto pelo governo- nada limitaria o tempo de concessão.
Ele diz que a prática internacional é de a concessão se estender pelo tempo de duração da jazida.
Há exceções. Argentina definiu no ano passado que suas concessões minerais terão validade máxima de 30 anos, renováveis, com impostos fixos durante o período para incentivar o minerador.
O "termo de referência" para a privatização da Vale, nome dado ao estudo preliminar que está sendo feito pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), em conjunto com a própria empresa, deve ficar pronto no início de maio.
Mas Elena Landau, diretora do BNDES para a área de privatização, adverte que o estudo do BNDES não será conclusivo.
Além do minério de ferro, a Vale possui ainda 1,1 bilhão de toneladas de reservas de bauxita (minério de alumínio); 1,2 bilhão de toneladas de cobre; 131 milhões de toneladas de manganês (usado na fabricação de aço); 65 milhões de toneladas de caulim (argila usada para branquear celulose de madeira para fazer papel); 300 toneladas de ouro; além de reservas de níquel, nióbio e titânio.
Fora do minério, a empresa participa ou controla empresas dos setores de siderurgia, inclusive fora do Brasil, papel e celulose, florestas e navegação. É também dona, co-proprietária ou arrendatária de nove portos ou terminais, um deles em Los Angeles (EUA).
Na navegação, sua subsidiária Docenave possui a segunda maior frota do Brasil, perdendo apenas para a Petrobrás.
Pelos métodos contábeis oficiais, a Vale e seu grupo faturaram no ano passado US$ 3,85 bilhões, contra US$ 2,57 bilhões em 93.
Mas se o cálculo adicionar a este faturamento a participação nas receitas das empresas em que tem participação, a quantia chega a US$ 4,1 bilhões, referentes ao ano passado. O número está sendo revisto e pode chegar aos US$ 5 bi.
A empresa fechou 1994 com um lucro líquido de US$ 645 milhões, contra US$ 262 milhões em 93. Sua dívida em final de 94 era de US$ 899 milhões, com cerca da metade vencendo este ano.
A Vale detém sozinha 18% da exportação mundial de minério de ferro. Com empresas coligadas ou nas quais tem participação, a fatia chega a 23% do mercado. A segunda colocada é a australiana Hamersley, com 14%.
Na área de alumínio, a estatal participa do controle de 36% da produção do Brasil, que é responsável, no mesmo patamar da China, por 6% da produção mundial.
Ela participa ainda de 29% do mercado brasileiro de papel e celulose, produtos dos quais o Brasil é o quarto maior produtor mundial, com 7% do total.

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