São Paulo, domingo, 23 de abril de 1995
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Será desta vez?

ROBERTO CAPUANO

Mais uma vez se anuncia a implantação da Caderneta de Poupança Vinculada à Compra de Imóvel que, na verdade, é a reutilização da mesma.
Talvez seja a décima vez que esse anúncio é feito, sem que nada tenha ocorrido de prático.
A caderneta foi lançada pelos corretores de imóveis em 1985 e, após três anos de muito trabalho e com decisivo apoio da imprensa, foi implantada em 1988.
Durou 30 dias. Na época, a Caixa Econômica Federal não fez a menor divulgação, não gastou uma linha ou um segundo de sua farta publicidade para promovê-la.
Ainda assim, o interesse foi tamanho e milhares de pessoas formavam filas de madrugada na porta das agências para obter uma senha que permitisse abrir esse tipo de poupança.
E por que tanto interesse? Pela absoluta inexistência de qualquer tipo de financiamento ao comprador que permitisse escolher e negociar livremente o imóvel de sua preferência.
Desde 1970, pelo menos, não se compra imóvel -e sim financiamento-, porque o consumidor é obrigado a escolher só entre os produtos que já venham com ele.
E quem tem financiamento em seu produto sabe dessa vantagem e cobra caro por isso, seja no preço, seja na qualidade.
Sabe que tem um mercado cativo a seu dispor, que não tem a concorrência do usado que seria a prioridade natural de quem vai comprar seu primeiro imóvel, como acontece quando compra seu primeiro carro.
Através da caderneta, o acesso ao financiamento é simples. O interessado vai até o agente financeiro e, de acordo com sua renda, especifica o valor do financiamento pretendido.
Ao contrário do que se possa pensar, a maioria dos pretendentes não aspira nada maior do que um crédito em torno de R$ 20 mil e R$ 30 mil.
É feito um contrato, no qual o interessado se compromete a depositar mensalmente -eram 36 meses- uma prestação até completar de 15% a 25% do financiamento que deseja.
O valor da poupança é tanto menor quanto o crédito desejado. Por outro lado, o agente financeiro se obriga, completada a poupança, a emitir uma carta de crédito para que ele compre livremente o que escolher.
A caderneta é boa sob todos os aspectos: para o poupador (que sabe que com algum sacrifício chegará finalmente à casa própria) e para o governo (que tem os recursos de poupança estabilizados e ampliados).
Para o mercado imobiliário também, porque é irrigado preferencialmente por adquirentes do primeiro imóvel e quem vende, compra -estatisticamente cada financiamento inicial gera seis operações- e termina inevitavelmente em um novo, ativando toda a indústria imobiliária.
Amplia essa indústria à medida que anima pequenos construtores a produzir, já que terão a certeza de compradores com dinheiro na mão.
Extraordinário para o consumidor que, com o direito de escolha e consequentemente com o comando do mercado, será beneficiado na concorrência de preços e qualidade a cortejá-lo.
Todos saem beneficiados pois, sem financiamento principalmente para o primeiro imóvel, todos estão condenados a serem inquilinos e não havendo, como não há, imóveis para alugar, os preços sobem e já atingem níveis jamais alcançados nos últimos 50 anos.
Vamos esperar que desta vez os agentes financeiros vençam sua incrível resistência ao financiamento individual e libertem o comprador da escravidão do imóvel já financiado.
Novo governo, novos tempos, nova mentalidade, vamos acreditar que desta vez a promessa da caderneta se torne realidade.

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