São Paulo, quarta-feira, 26 de abril de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Sérgio Britto milita pelo filme mudo

FERNANDA GODOY
COORDENADORA DE REPORTAGEM DA SUCURSAL DO RIO

A casa do ator e diretor de teatro Sérgio Britto, 72, é o lugar onde qualquer cinéfilo gostaria de ficar trancado. Mesmo que com a chave do lado de fora. Localizado em uma rua tranquila no Leblon (zona sul do Rio), o apartamento tem paredes inteiras forradas por fitas de vídeo e videolaser.
Cinemaníaco compulsivo, Britto reuniu, ao longo dos últimos 12 anos, uma coleção de 7.000 fitas de vídeo. Destas, 5.000 são filmes de todas as épocas. As demais são gravações de ópera, outra de suas paixões.
"Quando eu enlouqueço por uma coisa, vou em frente até o fim", diz. Nos três primeiros meses, Britto comprou 500 fitas. Até hoje, oscila entre 15 e 20 fitas por mês. Em cada viagem ao exterior, traz pelo menos 70.
Para Sérgio Britto, o cinema mudo é o cinema por excelência. "A grande arte cinematográfica é o cinema mudo. Você narra uma história através de um meio de expressão completamente diferente: graficamente é preto-e-branco, a tela é pequena e não tem som. É uma narrativa visual", define.
É entre os filmes mudos de Lubitsch, Chaplin, Murnau e René Clair que estão muitos dos favoritos de Britto em todos os tempos (veja lista à direita).
Anjo Exterminador
Sérgio Britto constitui uma espécie de "sociedade", que chegou a ter 70 membros. Cada um contribui com uma mensalidade -que é reinvestida na compra de novos fitas- e há reuniões para maratonas de quatro ou cinco filmes. "Já passamos uns três ou quartos carnavais inteiros vendo vídeo", diz.
O autor teatral Mauro Rasi, que também fazia parte da sociedade, escreveu uma peça -"Baile de Máscaras"- sobre essas reuniões.
"Ele fez uma espécie de 'O Anjo Exterminador' (filme de Buñuel em que os personagens não conseguem sair de uma casa). O sujeito entrava para ver filmes e não podia mais sair", diz. Hoje, o grupo conta com cerca de 30 pessoas.
"O vídeo me dá idéia de que a gente domina o filme. Quando você vai ao cinema, você é subjugado pela tela enorme, o filme te domina, te comanda. No vídeo, você vê o filme de outra maneira, você é quem domina", diz Britto.
Constituir seu próprio acervo foi também a solução encontrada por Sérgio Britto para saciar sua curiosidade sem precisar frequentar cineclubes. "Ninguém tem tempo para ir à cinemateca do Museu de Arte Moderna toda hora."
Greta Garbo fala
O amor de Sérgio Britto pelo cinema vem de longe. O primeiro filme que se lembra de ter visto é "Paramount on Parade", na verdade uma coletânea de cenas de vários filmes.
Aos 8 anos, já ia cinema três vezes por semana: "Às terças, filmes de horror; às quintas, românticos; aos domingos, o grande filme, um seriado e duas comédias em duas partes, tipo 'O Gordo e o Magro'. Eram filmes a quilo".
Uma das impressões que o marcou foi o impacto causado pela primeira vez que Greta Garbo falou no cinema, em "Anna Christie", filme de 1930. "Foi uma surpresa fantástica. Vários atores e atrizes desapareceram no cinema falado. Ela não, porque sua voz era lindíssima. Uma voz muito artificial, mas espetacular."
Embora já tenha passado em revista toda a história do cinema, Britto ainda é capaz de se empolgar com os novos talentos. Acha que Kenneth Brannagh fez a mais emocionante transposição de "Henrique 5º", de Shakespeare, para a tela. E acrescenta que "Tempo de Violência", de Tarantino, o manteve preso à cadeira.

Texto Anterior: Superprodução de Jeunet e Caro inaugura Festival de Cannes 95
Próximo Texto: OS PREFERIDOS DO ATOR
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.